A HISTÓRIA DO LENHADOR E SUA MULHER POBRE
Vocês já ouviram a história do lenhador e sua mulher pobre?
Viviam felizes na sua miséria, no campo, mas sem filhos.
O silêncio nas horas claras comia suas palavras, sua alegria.
Desejavam o campo fértil mas colhiam apenas pedras mudas.
Um dia encontraram à margem do lago
uma criança bem pequena abandonada.
Chorava de fome, era linda, uma menina
tão pequena, desamparada ali deixada.
A mulher e o lenhador se encantaram,
para longe da margem do lago a levaram.
Cuidaram, alimentaram, vestiram seu corpo
com a mesma pobreza que dividiam
para vê-la crescer em formosura
até que um dia...
A criança tornou-se essa jovem linda
e no meio de um mistério disse que faria
para a miséria do casal um belo vestido.
Como assim?
Costurar nada em nada não daria
ao corpo o que cobrir
além de um véu de nuvem para o rosto.
O lenhador e sua mulher ouviram
da filha crescida a estranha condição:
Vocês não podem ver o acontecer,
devo costurar longe dos seus olhos
e por nenhuma razão vejam como faço
o que faço - cabisbaixa ela lhes dizia.
Assim os pais aceitaram sem acreditar
que no dia seguinte ao estranho acordo
veriam a casa cheia de roupas novas
e, para maior surpresa, feitas de ouro.
Assim se deu, conforme se contou.
A moça escondeu-se, teceu, cortou
e costurou impressionantes vestimentas.
A alegria não podia ter fim.
Estamos ricos! dizia o lenhador à sua pobre mulher.
Nossa filha tece fios de ouro
e faz roupas tão lindas que poderiam ser vendidas
além do lago, na outra margem muitos nos veriam,
seríamos admirados, temos ouro mas nada de fartura.
Trocaremos algumas peças por comida,
outras por uma casa 'bem mais maior',
então teremos a filha, as roupas
e tudo que os outros não têm.
Até ali pensavam satisfeitos nunca observar
de onde vinham os fios da magia.
Mas, como tudo que abastece parece
pedir razão que sustente o medo de não durar,
o casal decidiu espiar a jovem escondida
esquecida em si mesma a tecer o nada ao nada
criando o que em nenhum lugar havia.
Assim olharam o que não deviam
esquecidos do acordo feito um dia.
No mesmo instante que viram
no puro silêncio a jovem que tecia
tudo se desfez
com a mesma voracidade
com que a fome os comia.
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Baltazar Gonçalves