Eu aprendi a falar e um mar

Internamente,

Comecei a viver em mim mesmo,

Antes de me jogar na selva, sem saber o seu preço,

O meu território, um San Marino inteiro (pense no seu tamanhozinho),

Escondido entre as montanhas, faceiro, encolhidinho,

No meu escritório os papéis voavam tanto... Cedo, eu tinha que organizar a minha vida interior, a luz da minha história, do meu auto-amor,

Mas eu era uma criança perdida por fora,

No meu lar doce lar eu só pensava em brincar,

Extravasava.. o que travava no sereno,

Era como se fosse sempre inverno,

o chão de neve e gelo o seu inferno,

Ou se, de um extremo eu fosse para o outro,

Do frio ao calor intenso, do bruto ao caprichoso,

Eu não conseguia encontrar um meio termo,

Talvez por minha condição de 'pobre enfermo',

Visse tudo com os olhos direito,

Quando se está por baixo,

As pessoas são mais honestas,

E isso basta,

Pelo menos você já sabe, quem serão os seus amigos e as suas trapaças,

Mesmo se quisesse confetes à toda hora,

Com frequência choviam canivetes sem demora,

Eu não conseguia me comunicar,

As palavras vinham apressadas,

E a minha língua, uma esperta operária,

Punha-se a protestar, fazendo greves ou operações tartarugas,

sempre exigindo os seus direitos, me apregoando a sua culpa,

Queria a sua dignidade primeiro, enquanto negava a minha,

Certo dia, no terror de falar em público,

Fui a um armazém que nem existe mais,

Pertinho de casa, eu, um beco sem saída,

Cheguei lá e perguntei, de súbito, depois de muito ensaiar:

"Quanto é o quilo do leite??",

Riram enquanto eu avermelhava,

Eu gaguejava,

E me diziam:

"Você precisa pensar antes de falar",

E pensava, chegava a criar peças, atuava como ator,

Mas na hora do espetáculo,

Era aquela pressa,

E vinha depois o inevitável rubor,

Eu era um palhaço,

Da tragédia, ia para a comédia,

Para evitar a dor, de ser involuntária mente chacota,

Pouco saía de casa, e da minha mente fogosa,

E lá dentro era tudo o que não podia,

Não sei se,

O que veio primeiro foi a imaginação,

Ou a timidez como guia,

Acho que sempre tive mais que um par de olhos,

Sempre tive esses olhos virados pra dentro,

Desde antes, quando eu não sabia que era gago, que não ligava, quando a infância era apenas fraternidade, ainda cabeças de vento,

Toda timidez é uma reação improvisada,

Pode-se nascer com ela, como uma adaptação possível,

Uma arma em momentos de tensão visível/risível,

Mas só o espaço e tempo podem decidir,

Se será imprescindível, e de fato, foi pra mim,

Evitei o máximo que podia,

De mostrar os meus defeitos,

Que todo mundo tem de qualquer jeito,

Mas quando a maioria tem os mesmos defeitos,

Se tornam rarefeitos, alegorias, desculpas

trejeitos, manias,

Qualquer coisa, menos defeitos.

O mar

Nunca me foi fiel,

Mas eu nunca lhe fui confiante,

Apenas antes,

Que me lembro de ti,

Areia mulher,

Sempre me aceitou, sem regras masculinas,

Ser o seu acompanhante,

O seu cheiro encontrado ao mar, de espuma cristalina

A areia molhada é o que eu sou,

Por isso o meu corpo sempre ousou,

Jogar-se ao meu espelho poroso, que parece profundo,

Fincar-me os pés pequenos e vacilantes, no seu peito gostoso,

Deitar o meu rosto em meu rosto sujo,

Sentir-me afundando em mim mesmo,

Por dentro eu sou qualquer coisa,

Do mar espesso e aberto até uma impensável ostra.