A VIDA PREGA PEÇAS

Ela chegava aos encontros

sempre de Uber,

a anja profana de cabelos compridos

que sabia seduzir

sem provocar,

marcava territórios de aromas

com Dolce & Gabbana.

No início era chato,

depois foi ficando normal

ouvir os vizinhos comentando:

lá vai a puta,

a sem vergonha,

mas no seu cartão de visita

estava escrito

acompanhante profissional.

Nenhum vizinho pagava

sua mensalidade na faculdade de direito,

não sustentava sua filha pequena,

sua mãe doente,

sua irmã cadeirante

depois de uma bala perdida.

O preço era fixo,

não aceitava cheques

nem cartão

e geralmente pago

com vinte notas de cem,

ninguém pedia desconto,

a não ser o velhinho simpático e rico

que morava lá no Belém,

ele era o único também,

que gentilmente abria a porta

na hora de ir embora.

Depois da transa

sempre sobrava tempo

para um cigarro,

algumas confidências

coisas e tal,

depois da formatura

alguém lhe deu o cartão

de uma advogada

que precisava de uma assistente,

ganhou o emprego como bico,

e ainda se descobriu bissexual,

nas primeiras vezes

a patroa quis lhe pagar,

ela disse não.

A vida prega peças,

esse é o motivo

dela ser tão linda e surpreendente,

no seu primeiro caso

uma mulher era a sua cliente,

estava se divorciando,

e de repente,

a advogada de primeira viagem

descobriu que o marido da mulher

também era seu cliente.