ESTRE A FLOR E A NÁUSEA - Livro completo
Autor: Agnaldo Tavares Gomes
APRESENTAÇÃO
Há pessoas que surgem na vida da gente como fragmento de um meteoro, e enfia em nosso coração com suas cores múltiplas...
Traz-nos à face um sorriso que permanece ao longo do tempo...
Na lembrança renasce vivamente como água de uma fonte límpida, inesgotável...
E como me recordo àqueles olhinhos tristes me rindo... Aquela voz tão doce me falando sobre a dinâmica do Universo...
Aquele riso com ruidinho...
Como me recordo da “pequena” poetisa que me mostrou com sua maneira aguerrida de lutar por seus ideais que a vida não é assim tão complicada como dizem por aí...
Eu, aprendiz dessa arte de viver calmamente os instantes que o tempo me presenteia, vou vivendo e acreditando aprender o puro significado da Vida:
Amar – simplesmente.
(As poesias que compõem este livro foram escritas em 2007 e 2008.)
DEDICATÓRIA
A uma aguerrida mulher-menina
Qual me deu sentido ao ser poeta.
EU...
Eu posso me dizer simplesmente
Que sob minha face ao papel
O mundo me transcorre...
De maneira lenta ou fugaz
As palavras viajam de mim para fora
Na velocidade dos meus dedos
E se põe a deitar na superfície em que escrevo...
E deitam como musas despidas.
O eu que sou apenas face
O eu que sou apenas imagem
O eu que sou apenas pensamento
São agora palavras que dizem de mim quando lidas.
CONTIGO
Estás no poema que leio ansioso
de um verso a outro.
No meu silêncio te ouço
gemer e sorrir dentro de mim – no coração.
Choro contigo quando choras um verso triste...
mas quando ris um verso feliz,
rio contigo...
Estou contigo pro que der e vier!
E sei que estás comigo.
A UMA SONETISTA
O soneto que leio tem o som
Da moça que o escreve melodicamente...
Jamais a ouvi noutro tom
Que neste que a ouço serenamente.
Ela me diz gostar de Drummond,
Talvez pelo humor, provavelmente.
Eu, Castro Alves, pelo dom
De servir a um povo extremamente.
Temos em comum o amor ao poema
E ela escreve tão bem o soneto
Um dia hei de vê-la correr a pena...
Mesmo que seja numa tela de cinema:
Ela à escrivaninha, eu na platéia, atento...
Mesmo que for assim, vale a pena.
TEU TÉDIO NO MEU TÉDIO
Por que tu sempre me queres por perto?
Quer dividir comigo teu tédio...?
Quer absorver um pouco do meu...?
Mas se nosso tédio, por acaso,
Dê uma congestão no espaço
E o mundo todo estremecer...?
E cair todos os palácios...?
E cair todos os casebres...?
E cair todas as torres...?
E cair todos os faróis...?
E se de repente na desordem
Despencar uma estrela lá de cima...
E tu que não tem medo sentir medo?
– medo de perder o tédio.
Já que me queres sempre por perto
O melhor mesmo é evitar...
Evitar teu tédio no meu tédio.
QUANDO A POETISA ESCREVE
Quando a poetisa escreve
O mundo silencia
Nenhum pio
De um pingo d’água na pia...
Tudo fica assim:
Se uma folha for cair,
Cai bem de mancinho
Pra não tremer o bico
De sua caneta BIC...
Nem o vento ousa balançar a cortina
Nem na vidraça tini
Um grão de areia fina...
Se por ali, na vizinhança,
Houver um ratinho faminto,
Roerá sem ruídos
A miudinha semente de trigo...
Silêncio que até o próprio silêncio ensina
A não rastar o chinelo quando caminha;
A não encher de ecos a piscina vazia...
Tudo por que...
Nada e ninguém ousam interromper
Quando a poetisa escreve a poesia...
SEMPRE DOIDOS
Deixaste desembarcar em mim
E te encontrei nua de alma
Vivendo em meu peito qual
O coração palpitante, sereno.
Deixando-me sem fuga, doido
Perdido e encontrado
No seio precioso de uma louca
Vivendo à mesma loucura:
Ora doce, ora amarga...
Ora feliz, ora triste...
Mas sempre e sempre doidos.
Sei que ris também ao espelho
Com sarcasmo da própria beleza
Porém eu rio, por não me achar encanto.
O HOMEM ALÉM DO POETA
Quero que me veja profundamente
De alma transparente, completa...
Que conheçam completamente
O homem além do poeta.
Quero que me leiam atentamente
Com teus olhinhos de poeta
Demoradamente...
O homem além do poeta.
Quero de maneira indiscreta
Dispor totalmente
O homem além do poeta.
Quero de mim repleta
Sabiamente...
O homem além do poeta.
AMIGA
“Se tu amas uma flor que se acha numa estrela,
é doce, de noite, olhar o céu”
(Sant Exupéry)
Amiga, hoje é domingo!
Leva-me à Liberdade contigo?
Vamos comprar uma caixinha com tirinhas
E vamos juntos fazer estrelinhas de origami...
Conta pra eu, viu,
Àquela estória infantil:
“O Pequeno Príncipe” de Sant Exupéry
Vou adorar ouvir de você!
Amiga, deixa-me deitar no teu colo?
Prometo, me calo,
E como um menino comportado
Ouvir-te ler Saramago... – de olhinhos vidrados –
Conta pra eu tuas filosofias,
Quero viajar em tuas teorias...
Em teus poemas...
– que linda cena: um poeta ao colo de uma poetisa atentamente –
Amiga, também quero um presentinho...!
E quero com bastante carinho.
Pode ser um café bem quentinho ou um cafuné na nuca...
Juro, não esquecer nunca!
Vou lembrar ao fim de mim.
Se eu for primeiro, promete pra eu
Me procurar toda noite no céu
Como se eu fosse “guizos que riem”?
E jura rir também?...
Amiga, peço mil desculpas por esse meu jeito patético
De querer sempre poético
Dizer de mim
Pra ti.
Perdoa-me?
O APRENDIZ
Teus olhos são como estrelas que riem... (mesmo tristes)
E tu me ensinaste a ser feliz
E eu aprendiz contemplando-te
Mesmo no porta-retratos na estante.
Tu sorris perfeitinha – eu bobo
Parece que a muito – tempos outros
Convivemos juntos de algum modo
Talvez no céu – éramos astros!
Juro, não sabia o que eram guizos,
Nem o que eram estrelas de origami
Muito menos a estória de “O Pequeno Príncipe”.
Mas tu que me ensinaste a ser feliz
Também a gostar de Drummond
De “A Flor e a Náusea” de monte.
TU, EU
Tu – me acendes os olhos
Eu – vivo
Tu – vens ao meu caminho
Eu – rio
Tu – não vais nunca
(Porque Eu te amo!)
Tu – sempre minha
Eu – sempre de você...
Tu – minha princesa
Eu – teu príncipe (sem cavalo)
Tu – poetisa
Eu – poeta
Tu – poema
Eu – poesia
Tu – canção
Eu – cantiga
Tu – Drummond
Eu – Castro Alves
Tu – estrela
Eu – contemplador
Tu – imperatriz
Eu – imperador
Tu – feliz
Eu – aprendiz
Tu – encantas
Eu – um tonto
Tu – rainha
Eu – misero rei
Tu – muito sabes
Eu – pouco sei
Tu – eterna
Eu – também
Tu – me gostas
Eu – te quero bem
Tu – a mulher menina ao tapete
Lambuzada de sorvete...
Eu – o homem menino de olhos sérios
Tentando fazer um soneto...
Tu – sonetista incrível
Eu – mero artista
Tu – sempre linda
Eu – meio feio
Tu – mágica
Eu – sei
Tu – cativa
Eu – reconheço
Tu – cantas
Eu – escuto
Tu – falas
Eu – mudo
Tu – modesta
Eu – modesto
Tu – detestas o mundo injusto
Eu – detesto o mundo injusto
Tu – fiel a mim
Eu – fidelidade a ti
Tu – verdade (não mente)
Eu – não minto (verdade)
Tu – me sentes
Eu – te sinto
Tu – existes
Eu – existo
Tu – em mim
Eu – em ti
Pra sempre! – até o infinito
De eu e ti.
POETAS
Seremos sempre livres enquanto
Houver linhas para corrermos versos...
Mesmo que sejam imaginárias.
Seremos sempre os poetas deste tempo
Mesmo que termine toda tinta,
Que não haja mais caneta, nem lápis e nem pena.
Escreveremos na areia mesmo que as ondas apaguem...
Escreveremos com giz mesmo que a esponja desmanche...
Seremos sempre, sempre eternos...
Mesmo que a vida seja breve,
Mesmo que o corpo seja
mortal.
UM POETA SEM ORIGEM
Eis que à noite morresse um poeta
De assombro, de cisma, de tédio...
Eis que o despencasse de um prédio
Do décimo, vigésimo, trigésimo...
Eis que na perícia constatassem:
Catástrofe de amor no peito.
Eis que fosse ele um bom sujeito:
Honesto, caridoso, sem orgulho.
Eis que não lhe caísse uma lágrima
Sequer de piedade, sequer de graça
Da sua infeliz desgraça...
Eis que o sepultassem em cova alheia
Sem cruz... Apenas uma estaca inscrita:
Jaz aqui um homem sem origem poética.
ESPERA...
Espero o poema como quem espera
O amor entrar pela janela
Deitar-me a face no ombro
Olhar-me com olhos de quimera...
Espero o poema como quem espera
O primeiro beijo no lábio
O primeiro afago no rosto
A primeira flor da primavera...
Espero o poema como quem espera
O filho pródigo errante
A vela ascendente no oceano...
Espero o poema como quem espera
Uma mão acenar distante
O olhar comover-se de encanto...
O MOÇO DO ESPELHO
Nalgum canto deste país
O coração de um poeta vive
E vive palpitante e feliz
Vivendo você no poema.
Tem a felicidade de um moço
Que não espera além
Que o beijo quente no rosto
O perfume dos ombros da amiga.
Mas se houver outro
Com tanta ternura, te peço
Chame a mim que eu o conheço.
É o mesmo que a muito o vejo,
Modesto em dizer de si mesmo...
Aquele moço do espelho.
SINOPSES NAS PAREDES
Quando ela estiver lendo as paredes...
Por favor, não se deixe à frente,
Melhor não pôr gelo em seu café quente.
Ela pode “rodar a baiana”
– mesmo que ela seja paulistana.
Ela pode te rogar uma praga
– olha que praga de poetisa pega –
Eu que não me arrisco pôr meu nariz
Quando ela estiver lendo as paredes...
– Deus me livre!
Prefiro olhar seus olhinhos a ler
As sinopses das obras de certo alemão
De “coração de pedra”
– como ela mesma disse.
TARDE – E MUITO TARDE –
Um dia vai se lembrar de mim
E quando, eu não serei mais triste
E eu serei feliz como nunca viste
E eu serei assim ao fim de mim...
E neste dia vai perceber, me ama
Daí não haverá mais eu pra ti
Nem haverá mais tu pra mim
Porque nos morreste a “velha chama”
E a cama que nunca nos recebestes
Continuará feita, a espera perpétua...
Eu virgem de você, você virgem de mim.
Porque será tarde – e muito tarde
Quando se tocar que chega o fim
E eu não serei mais (pra sempre) teu poeta.
QUEM SERÁ?
Quando souber por aí
Que morreu um poeta de tanto rir...
Não se admire!
Eu não fui o poeta.
Quando por aí souber
Que levou um poeta ao albergue... (de loucos)
Nem pense!
Eu não fui o poeta.
Quando souber
Que suicidou um poeta no “Chá”
Não! Não corra pra lá!
É tempo perdido... (não chego a tanto)
Mas, quando souber
Que um poeta deixou de ser poeta...
Não rias... Te esperta!
Eu fui o poeta.
A AUSENTE
“Amor é fogo que arde sem se ver;
É ferida que dói e não se sente”
(Camões)
Por que assim foge pra distante?...
Por medo ou pretensões?
Prefere o silêncio, acha contemplante
Esse teu amigo de ilusões.
Me possui sem olhar na fronte
Sem deixar no rosto o beijo diário
Inquietar teu peito ao meu – semelhante
Ao mesmo amor – Esse amor literário.
Diz-me: “O amor é ridículo” – contesto
Eu lhe digo: “eis a razão
Para que o amor seja completo”.
Mudou de repente o semblante
Deixando sua voz recitar Camões
Um poema de amor (ridículo) ao “poeta errante”.
NA MESMA TAÇA
“Ai”! Quando um crânio já não tem mais cérebro
... Podeis de vinho o encher!”
(Byron)
... E rio, e choro, e tremo...
Nesta hora vivo-te assim
Com a penúria de um peregrino
Mendigando amor no desalento
No descampado sem fim...
E vejo tuas espáduas nuas
Vagamente num tênue arfar
Qual a vela no mar ecoa
E dar-se imensidão coroa
Aos meus braços se entregar...
E sinto estremecer teus os seios
Ao te espreitar ao meu peito
E ao te beijar sinto
O calor de um beijo leigo...
Nesta hora minha alma levita
Dou-me a olhar-te sem pressa
Eu tremo, eu canto, eu rio...
E sobre espumas de ouro
Flutuo-me aos astros em festa...
Aos passos ritmados lá vamos
Desbravar mares e oceanos...
Ouço qual o vento na proa
Uma cantiga entoa...
É a voz de minha poetisa!
Olhar de Maria a cruz
Extremamente infeliz!...
Amparada aos braços o filho
Depois de sucumbir ao crucifixo
Depois de consumar o martírio...
Eis minha mulher! Minha amiga!...
Eis minha Sara! Minha Helena!...
Eis minha Eurídice! Minha Eugênia!...
Eis minha menina! Minha eterna!...
Eis minha adorável poeta!...
Eis por qual bebo Atento
O poema melancólico de adeus...
E bebo na mesma taça o tormento
No mesmo crânio que o poeta errante
No mesmo que atriz amante
No crânio humano de Byron.
SILÊNCIO CONTÍNUO...
Silencio-me porque já não há palavras
Gastei todas na tentativa inútil de trazer de volta
aquela a quem dei o coração...
Aos meus amigos, poetas ou não,
passei a dizê-los: não ames
Porém se amar
não entregue de todo o coração...
Meu olhar sempre aquele de mil e oitocentos:
atirado para fora de mim,
ao infinito...
Vivo sempre assim recordando...
Disseram-me para eu esquecê-la
E dizem-me não vale à pena
E eu vos digo sempre:
Não sabeis o que é amar uma Helena.
(e não sabeis mesmo)
Tentai-me convencer inutilmente
E inutilmente eu sempre digo e sempre direi:
Não sabeis o que é amar uma Helena.
Meu silêncio prossegue...
MANIFESTO AO SILÊNCIO EM MIM
Hei de quebrar o silêncio em mim!...
Despedaçar cristais, derrubar pratos e talheres;
Assustar mulheres com falsas baratas...
Ligar as torneiras, bater as portas e janelas;
Fazer literalmente arruaça...
Soltar os cães nas praças...
Quero acordar as crianças para juntar a mim...
Darei brinquedos – os mais barulhentos.
Tambores, apitos, trombetas, pandeiros
E vamos fazer baderna o ano inteiro...
Convidarei os meninos criançolas:
Os alemães, os crioulos
A uma pelada noturna no meio da rua...
Vamos atirar bola às vidraças
Gritar palavrões, contar piadas
Saltar altas gargalhadas...
Pular as muretas que resguardam as casas...
Que saldem os cachorros!
Que chamem o guarda! (aquele do apito)
Mas que venha apitando...
Que chamem a rota!
Que chamem o bombeiro!
– pusemos fogo no mundo inteiro.
Chamem, por favor, a ambulância! (quebrei o dedo)
Quero acordar a vizinhança inteira...
Quero os vovôs de pijama arrastando chinelos...
Quero as vovós fuxiqueiras de suas janelas
Em sentinelas rosnando e raiando-nos...
As ladainhas das mães aos filhos
Os sermões dos pais, dos padres, pastores, juízes...
A noite inviolada seu silêncio contido...
Estou farto!... Muito farto.
Farto do silêncio em mim.
IRMÃO NO POEMA...
Amigo, irmão no poema,
Me pergunta se vale a pena?
Digo que vale... Vale sim
Morrer por uma Helena...
Vale reviver também.
Já não vivo, meu amigo
Temo sofrer o peito de outra amante
Temo gelar o rosto dela
Beijar sem fogo no lábio
Recostando a meu peito morto...
Não me ame mulher... Não me ame!
Jamais me queira a teu cativo
Não quero te falecer ainda virgem...
“... não me apertes assim contra teu seio...”
Não me procure no lábio além do beijo
Não queira requentar o meu desejo...
Irmão no poema...
Alertai as mulheres – todas elas
Conte que não vale a pena
que ainda espero por minha Helena...
VERSOS EMPRESTADOS
“Por que foges assim, barco ligeiro?
Por que foges do pávido poeta? ”
(Castro Alves)
Trago estes versos a embalar teu sono
A te acordar os olhos
atentarem a mim
Clamar! Clamar! Clamar!...
Vão estes versos não meus
Mas que o poeta – se vivo
Me emprestariam – a causa é justa.
Vão te aborrecer ou te bradar
Fazer-te sorrir ou te fazer chorar
Mas nunca! Nunca! Nunca!... Odiar...
Vão cantarolar a ti
Um canto harmonioso...
Levitar teus pés
Pôr nas nuvens – acredito.
Te trazer braços que já não tenho...
Vão-te estes versos
E não me negues resposta:
“Por que foges assim, barco ligeiro?
Por que foges do pávido poeta? ”
A UMA GUERREIRA
Mesmo que seja triste
Ris maravilhosamente bem...
Mais que outras moças felizes
Que se dizem por aí cem por cem.
Não sei o fardo que suporta
Eu no teu lugar fraquejaria
Suporta com vigor, muita fibra
Jamais conheci tamanha ousadia.
Nem nas histórias da Grécia Antiga
(mesmo que eu seja leigo nelas)
Impossível de existir tamanha guerreira.
Enquanto Vênus (deusa do amor) se inteira
A proteger os marinheiros lusitanos
Tu, deusa poetisa, os poetas baianos.
O ÚLTIMO HÁLITO
Ah!... Eugênia, mais uma vez vieste
E vieste no teu voou ofegante
E puseste no meu peito uma estrela em fogo
E mais uma vez cruelmente morro...
Me ver desfalecer e não diz nada
Cruza os braços, põe distante, acalma...
Bem sabe não te quero abstratamente
Te amo, te venero, espero eternamente...
Porque te esconde de mim, alma poeta?
Teu prazer talvez seja me ver padecer...
E quantas vezes mais terei de morrer?...
Acorda os olhos minha adorável poetisa!
Pode ser a última vez que o gênio vive
A última vez que o lança teus olhos tristes...
SONETO AO ÚLTIMO SONETO
Tenho medo amiga... Tenho medo
Só me acalenta o rosto o poema
Mas sinto que os versos me fogem
Qual o gênio foge do poeta.
Tenho medo amiga... Tenho medo
Sinto a palidez em mim...
A ausência de versos moços
Penso que já não vivo... - morro
Tenho medo amiga... Tenho medo
Já não me vejo marchar o poema
Trazendo ao punho dourada pena...
Tenho medo amiga... E muito medo
Temo que estes sejam meus últimos versos
Últimos versos ao último soneto.
MORRI O SONETISTA
Sempre haverá um soneto sob a pena
Mas jamais irei de deixar correr os versos
Prefiro o tormento de contar ao universo
Que deixo o soneto, mas continuo o poema...
Aos amigos poetas e não poetas
Iguais a mim chamados anarquistas
Aos que me ama e aos que me detesta
Peço a compreensão: morri o sonetista...
Não que perdi a eloqüência, a dialética
Nem a receita de um bom soneto
Não que a tinta insuficiente seja
Mas que é preciso lutar a poética...
Faço ao silêncio de uma poetisa
Que me diz se encontrar por completa
Que a felicidade não cabe em seus versos.
Morre o sonetista, continua o poeta...
AOS IRMÃOS POETAS
Eis que estendeste tua mão a mim...
E eis que meus olhos alcançaram ti
A contemplar-me com benevolência...
Eu já não era mais menino, nem moço e nem poeta
Perdia a meninice aos vinte e sete
Perdia a mocidade aos vinte e sete
Perdia a poesia aos vinte e sete.
Mas, tua mão estendida a mim
Sustentou-me de pé
Justo quando a fé me esvaia...
Justo quando a fadiga da angústia paralisava meus músculos
Roubava-me as manhãs de domingo...
E aquele “palhaço” em mim...
E aquele romântico de olhos distantes...
E aquele brasileiro que acredita que
a pátria a ser zelada é o mundo...
Este tua mão aqueceu o peito
Deu ânimo, despertou o humor
E deu águias...
E o melhor de tudo,
Fez renascer o amor...
Tenho-me grato, irmão poeta.
Grado a ti que também escreve a vida
Com a dourada pena... – o poema.
Eis minha gratidão.
POR QUÊ...
Por que não tentou me compreender? (partiu)
Ficou pasma com minha eloquência?
Com meu modo “estranho” de amar pra sempre?...
Julgou meu amor ridículo, vulgar, sem ênfase
Algo perigoso, proibido, superficial?...
Por que não tentou outra coisa?
Fugir de me fugir... – talvez
Contrariar teu ego de levar sem mim – tua cruz
Sem que eu tome parte do teu martírio...
E onde posso te encontrar agora, meu bem?...
“Além de aqui dentro de mim...”
A vida é breve e única.
Sabe, não sou o mesmo depois de ti...
Se ainda vivo é porque te sinto e pressinto...
Se rio às vezes, se às vezes canto
É que teu encanto presente está
Neste peito meu poeta...
Sei, não me esquece um só momento
E eu não te esqueço instante sequer.
E nesta agonia de querer chorar, morrendo...
Luto e reluto contra tudo e todos
Na esperança mínima de te encontrar – de novo.
Nunca me diz amar... Mas nem precisa
Não quis tornar teu amor vulgar
Provou me amar fugindo...
E eu, sem querer, te compreendo...
O TEMPO DE UM CAFÉ
Espero por você um tempo breve
Que dê ao menos para um café
Mas se por acaso estiver
Um pouco frio... caindo neve...
Espero o tempo de outro café... – e só.
Um terceiro café perderia o sono
E eu prefiro dormir...
Odeio esperar!
AMO-TE TANTO...
...e eu te amo!... E amo tanto
E ninguém mais sabe que ti
E eu te lego a vida em mim
E quero que me envolva a teu manto...
... e ninguém mais sabe que ti
E eu te amo!... E amo tanto
E eu te lego a vida em mim
E quero que me envolva a teu manto...
... e eu te lego a vida em mim
E ninguém mais sabe que ti
E eu te amo!... E amo tanto
E quero que me envolva a teu manto...
... e quero que me envolva a teu manto...
E eu te lego a vida em mim
E ninguém mais sabe que ti
E eu te amo!... Amo-te tanto...
O SILÊNCIO DE NÓS
Não posso deixar o silêncio nos consumir
Derrubo os cristais de sobre a mesa – despedaço
E encho o vazio de todo o espaço...
O silêncio não é o remédio.
Corro as cortinas nevadas que exilam as montanhas
E do alto – bem do alto de uma delas – te clamo
E o eco de minha voz responde o clamor dolorido, angustiado...
Não há intenção de humor em minhas palavras.
E esta flor,
Esta que nascera no peito de mim
– tão mergulhada em sonhos.
Persiste em perfumar minha alma
– tão devastada alma no assombro das ilusões.
Esta flor me acalma o coração pungente...
Me traz animação à estátua que me aparento ser:
fria e morta...
Mas este silêncio preocupa-me e traz presunções,
Alucinações...
Prefiro o ruído das máquinas incansáveis que
este silêncio
Prefiro o silêncio do poço que este silêncio
Que este silêncio eu prefiro outro
Que não seja da mesma composição.
DOU GRAÇAS A TI
Você deu ênfase ao espírito de luta em mim
As águias mais velozes e ages
Armas e as armaduras que trago comigo...
O brasão que levo ao peito tem seu retrato.
Se há um gênio em mim pulsando
Se há um coração bradando amor
Se há um poeta além de um poeta
Dou graças a ti.
Se um dia, porventura,
Conhecerem-me como sou
Direi: não só eu vivo,
vives também em mim.
Tu és o assomo daquilo que me faltava,
Aquilo que havia em mim
Mas que desconhecia...
Cantas no meu canto contra a infâmia
Valentia os fracos e covardia os fortes...
Tu, mais que sempre presente,
Presente comigo...
No último dos meus gemidos direi teu nome
Qual a última nota de uma canção
De uma oração última palavra.
GIRASSOL DE ORIGAMI
No girassol de origami que fizeste
Com tuas mãozinhas de fada – tão belas!
Escreva um verso bem doce
Dizendo que és a poeta do poeta...
Adoça as palavras com a doçura
De tua poética magnífica – tão doce!
E rias... E rias muito
Mesmo que teus olhos sejam tristes.
Me faça um soneto bem simples
Um soneto de amor – feliz!
Só você sabe despertar
O sonetista em mim adormecido.
Não estou para o soneto – por você
Mas estou para a poesia – pra você
E sei que está para mim
Além no girassol de origami.
SEMPRE AMANTE...
Minha alma sempre amante...
Negou-me o eterno beijo
A mim que quis morrer sobre ti
No calor da vida em teus seios...
E o que é o viver alheio?
Talvez um fantasma noturno
Uma sombra a vagar sem rumo
Pelas ruas desertas do meu peito...
E quanto tormento sinto eu...
Parastes pra pensar em mim?
Então, minha alma sempre amante!
Aproxima de mim – do invalido poeta
Olhe-me na fronte
Deita-me na testa
Teu beijo em fogo – em festa.
Perceberás então que morro
Que a poesia me foge de mim,
Como o barco foge do poeta...
TE AMAR
Perdão por te amar tanto?
Não quis trazer assombro aos olhos moços
Não quis te afastar de mim não
Assoprar teu barco regresso ao porto
Donde veio com teus poemas e mistérios...
Não quis teus olhos fugidos de mim
No meu rosto o beijo último
O gosto do adeus, a sensação de fim...
Perdão?
Eu não sei não te amar
Só sei venerar
Adorar
Amar
Infinitamente...
AUSÊNCIA
Amanhã morrerá um poeta virgem
No seio de uma louca ausente
Morrerá amargamente
Sem provo do lábio o beijo
Despojado no orgasmo o desejo
Sem nunca dito no olho desta
Que a ama infinitamente...
Somos virgens de nós mesmos.
No meu vario a vejo, sinto...
Minha mão lhe recata o seio nu
Minha boca em tuas espáduas desliza...
E consumo o beijo ardente
E desfruto o corpo veemente...
Esta “louca” matou o poeta ausente.
A MINHA CRIANÇA
Onde minha criança está agora?...
Lá fora a chuva desaba...
Aqui... – no meu peito
Um coração não sabe se palpita
Ou se deixa a vida...
Já não tenho sonhos e desejos faustos
Não mais a pirâmide ao sono profundo...
O balsamo perfumado que
Os milenares faraós do Egito.
Tenho o pão, a água e a misericórdia
Daquele no qual tudo posso e confio
E espero a redenção de mim
O perdão as minhas discórdias na vida
Minha criança: tão jovem, tão linda
Sinto que ela vive e chora
E rir seus olhinhos tristes
Correndo os versos que lhe fiz...
Horas me perco assim, contrito
O pensamento longe – no oceano
Onde as naus errantes sem rumo
Aos ventos desbravam o mundo...
E vou pensando em minha criança
Abraçando seu riso como se possível.
Adorando, venerando
Qual única santa de meu catolicismo.
A OITAVA COR DO ARCO-ÍRIS
Te recordo como recordo as notas de uma canção...
Eras a oração do meu dia
A poesia na minha mesa junto ao pão...
E como são fugazes os anos, meu bem
São ligeiros vagões em trilhos ferventes
A descarrilar em algum canto... – sabe lá onde!
Hoje, te lembro como algo passado – com saudade.
Mas, ainda uma lembrança presente,
Um “sonho distante” que quiseras ser lembrada...
Eras mulher que me mostrou o amor
Mesmo que eu nunca compreendera
Tua enigmática maneira de me amar...
Hoje te recordo ainda... – felicitado!
E teu olhar, teus risos
Será sempre a oitava cor do arco-íris...
ETERNA
Ah, este silêncio triste... – sinistro!
Essa casa tão calma, sem passos na sala...
Tão deixada alma de mim no vão espaço das ilusões...
Por onde anda as crianças que outrora brincavam?
Em que poço morreu suas gargalhadas?
Onde estou depois de ti, meu bem?
Há em mim um silêncio tremendo... – medonho
Uma luz semiapagada, orvalhada.
Já não sei mais chorar, minhas lágrimas
Ficaram no recinto da saudade.
É dor, angústia, tormento...
Um sorriso teu meu invento! Por favor
Espelho do calidoscópio
Onde vejo minha face em mil cores...
De meus amores, a perfeição
Inspiração divina, imaculada menina
Eterna e poeta e amante
Desde moço “às faces do poeta errante...”
“DIZEI SE HÁ DOR, QUE SE COMPARE À MINHA!...”
Digo-lhe poeta, digo que sim.
Padeço de dor semelhante
A que padeceste por Nini...
Meu coração perde o colorido
A mocidade me foge dos olhos
Ouço a cantiga no mar aflito.
Por que, meu Deus? Por que
Tamanha angústia neste ser?
Não há remorso no coração de Nini?
Oh!... Minha eterna poeta
Meu astro cintilante!
Perde as asas teu colibri errante...
Vem-me na fronte... Vem beijar
Fazer de teu peito o antro
Onde renovo as águias pra voar...
Vem comigo! Vamos dançar
Dois cisnes no mar
Calmo à orquestra de teus risos...
Dê-me a viver contigo meu anjo lindo!
Toma-me num beijo veemente
Envolto ao cachenê eternamente...
Mas, me diz: “impossível!
A liberdade não há cativo”
E deixa-me comigo... E vai contigo...
Ouça o peregrino que a ti implora!
E não lhes comove
Pois vida a ensinou ser forte.
E vai contigo... E deixa-me comigo...
Eu e o cachenê aos olhos
No vago espaço dos sonhos...
ENTRE A FLOR E A NÁUSEA
“O tempo pobre, o poeta pobre
Fundem-se no mesmo impasse”
(Carlos Drummond)
Tomou-me pela mão e me levou contigo
Pelas ruas desertas a conhecer o poema...
E entre “a flor e a náusea” deixou-me prendido
A escutar a voz de um poeta jamais esquecido.
Pisava sobre espinhos e não sentia o dolorido
Apenas observava o colorido daquela flor
Que tão mágica nascia na rua...
E sem a razão, sem a preocupação de perguntar,
Eu apenas sorria...
Eu era o poeta dos poetas! – e era feliz...
Eu dei a minha vida sem receio de perdê-la...
E nada mais lindo que dar a vida deste modo
– mesmo sem intenção de tornar lindo.
Fui aprendiz contemplando-a...
Aprendi a perder o medo de amar
– e o medo de sentir medo.
A andar nas nuvens mesmo estando no chão,
A cantar e a gostar de me escutar
Arranhar os acordes de um velho violão...
E fui feliz... E fui triste...
Eu debrucei algumas lágrimas ao papel virgem...
E talvez estas sejam minhas últimas
Porque não vejo o porquê...
Assim ela me diz: “deixei o poema pra ser feliz...”
Até o fim de mim irei recordar sempre
Dos olhos tristes que me ria tão lindo,
Entre “a flor e a náusea” – às reticências do tempo.