Molho blasé e outros molhos

O molho blasé

Que deixa os olhos revirados

Dá aquele sabor azedo

Faz o calmo revoltado

Mas de sossego

O olhar afetado

Na indiferença, grita

A sua histeria é no silêncio

O sarcasmo, o seu mais nobre sentimento

Uma pitada de pimenta

Que arde sem ferir

Que sorri sem sorrir

Que despreza ambiguamente

Enquanto lamenta

Por ter lamentado

A religião não é um mito

A mitologia não é religião

O mito não é filosofia

O divino não é fantasia

É a mais intensa e profunda realidade

Está além de tudo, está em tudo

É a sua essência

Está além da própria verdade

É a origem de todos os fatos

De todas as imagens

De todas as margens

Do universo

Levante ou levante

Levante da cama

Dos sonhos

Que as mãos esperam por seus donos

Derramam de suor ou abandono

Levante, o dia espera

Nos levantamos

Levante, a revolta berra

Nos jogamos

Levante, o trabalho espera

Nos doutrinamos

E quando

E quando é tarde e eu digo boa noite

E quando é dia e eu digo sorria

E quando é noite e eu digo já é tarde

Ontem eu tive

Um sonhadelo

Não sei se chorava de rir

Ou se sorria de desespero

Não sei que emoção eu deveria ter sentido

Apenas tive

Um sonho meio pesadelo

Um pesadelo meio sonho

Tal como um dia inteiro

Sem banho

E sem cheiro

A criatividade é uma soma

Um peixe, eu vejo dois, três

Os seus olhos cegos, eu os vejo brilhantes,

Vejo a sua boca, falante

Eu vejo um quadro incompleto

Uma meia árvore, um meio corpo, um cetro

Eu infiro onde parou, onde os sentidos não alcançam

Errado ou não, eu arrisco, arisco, risco o vidro do incerto,

Com a lança eu não caço perto

A criatividade é uma soma

Mas pode ser o que quiser

Divide o conhecido

Multiplica os seus limites

Pode tirar-lhe os velhos tiques

Criatividade, anarquia

Quase um sinônimo de liberdade

É a sua liturgia

Alegro-me

Agarro-me aos grãos de esperança

Os como, como se fossem pujança

Mas grãos apenas, é a minha janta

Alegro-me pelo que tenho nas mãos

Que ainda as tenho, tementes pelo trovão

E eu temente, que ainda tenho um chão