Circular

Sinto-me saído recentemente de um

romance de Dostoiévski

ou, quem sabe, de uma narração de Kafka

perdi todas as palavras e

todos sentidos recentes perdi

Escutei uma música ao longe; entorpecido fiquei

como fico sem entender cada centímetro de minha vida

Sou mais do que simples palavra (in)exatas

Sentei-me só num quarto de hotel

encontrei-me com meu passado; sonho

conjugo todos os tempos

e retransformo as conjecturas habituais

Mergulho no esquecimento, nunca existi

neste real irreal de fantasias subjetivas

ainda não separei os livros e os litros e as emoções

enclausurei todas as impossibilidades que apareceram

e libertei minha mente

para além dos sonhos que um dia tive

Ah! Estar cansado e jogar fora todas as ilusões

e deixar o coração – superlativo de emoções

e deixar o coração (des)encontrar seu próprio (des)caminho

e deixar o coração, deixá-lo

simplesmente deixá-lo à beira desta parte

Pseudo parte relativa de um real objetivo

sempre objetivo no sonho coletivo

Deixem-me quieto em minha anormalidade!

relatar a um olhar (im)possível, (im)passível

de encontrar simplesmente encontrar...

Somente agora soube de meus fatos

subjetivei tudo a meu bel-prazer

e escondi de mim mesmo um sorriso e uma lágrima

Como seria bom viajar!

e ir para longe de toda memória

e ir para longe de toda história

e me ver parado, contemplativo

observando a multidão agitada correndo inerte contra si própria

observando os monumentos observando...

e seguir irresponsavelmente todas as improbabilidades inusuais

Mas nem atravesso a rua...

Alucinações me dominam

um prazer intenso passageiro passa por mim

permaneço parado e esqueço o futuro-passado

Termino o poema

Com o sentimento de ter saído recentemente de um...