Ciclo

olhando em retrospecto

nas páginas desse caderno amarelado

vejo rostos e vozes borradas;

o passado condensado em grosso caldo.

os versos que me devastaram

contemplo hoje a longa distância

como ilhas arrastadas

pelo movimento das ondas.

das noites suadas e insones

carregadas de avidez e de fome

lembro com escárnio e pena

da tão tola e febril mácula.

depois do atropelo do tempo,

a firmeza da mansidão;

o conta-gotas dos dias

é implacável na sua lição.

e pela ordem das compensações

noutra esquina do planeta

um novo poeta há de herdar

essa angústia de dura beleza.

e escrever, e arder, e ruir, e sangrar

se consumir e devorar

no calor da própria chama

até restar somente o pó e a paz.

o poeta, algoz de si mesmo

é a escolha e a renúncia

a chibata e a borboleta

a doença e a cura.

pedro toscan
Enviado por pedro toscan em 22/12/2017
Reeditado em 26/12/2017
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