QUANDO PAREI ALGUNS CORAÇÕES
Alguns corações são coitados sem-teto, sem voz, sem destino, sem vida,
vão sendo levados pelos seus arames frágeis como incautas criaturas,
vagam ao léu até não aguentar mais.
Outros corações são ciganos perpétuos sem alforria,
tudo que entendem, desentendem no segundo que vem,
sua memória é tão forte quanto remela da lesma.
Engana-se quem supõe que tem só um coração gritando no peito,
de fato tem uma porrada de corações funcionando saindo do ritmo,
uma orquestra de malucos que não entendem a que vieram,
nem a quem deveriam servir, ou seduzir.
Já parei alguns corações tantas vezes que já perdi a conta
e ficaram ali, mortos, até que cuspi neles e os mandei acordar.
Nessa hora olharam pra mim mesclando empáfia e surpresa,
como tivessem sido flagrados, feito ator de quinta,
mas de fato sabiam que se dependesse de mim os jogaria longe,
só pra não ter que sentir mais soluços de dor,
nem as manchas encardidas do pesar,
nem as rebarbas afiadas do medo,
nem os golpes traiçoeiros da paixão,
nem as desculpas esfarrapadas do gozo que fugiu da raia,
e nem os galopes afoitos querendo fazer seu dono um tiquinho feliz,
um tiquinho que fosse, pode acreditar.
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