Chove sobre os lírios

chove sobre os lírios

não a chuva que chovia

sobre tudo

sobre os círculos concêntricos

dos mamilos dos teus seios

sobre as ígneas gaiolas

dos pássaros abertos da tua infância

entoando no telhado

um som complacente e ritmado dos pingos

que vazavam sobre as bordas dos telhados

hoje a chuva não escorre em prantos

pelos caminhos incandescentes dos telhados acesos

não deixa no ar o olor ameno e quente

da terra molhada

não molha minhas mãos

enquanto em barro me multiplico

e me repito na angustia de ser a mesma sombra

a mesma mágoa

não molha os canteiros exauridos

não toca cúmplice flores e seus tempos incertos

nem cria tramas e cores indevassáveis

onde vicejava a eternidade

onde plasmavam-se sonhos

e estrelas

acordando as vozes

com as quais ainda teço e digo teu nome

confessando a ambivalência das madrugadas