MINHA AGONIA ECOADA GRÃO A GRÃO
Ela estava mais linda que nunca.
Seus lábios pareciam farpas afiadas,
tresloucadas, afincadas num torpor de granito
que nunca senti antes.
Embebia sua língua com meus fiapos de sedutor
barato, pingando suor pelos cantos do quarto
numa enxurrada implacável.
Seus cabelos se mostravam requebrando
pra mim, numa cadência bêbada que dava dó.
Pegava naquelas mãos roucas, pilhadas,
escravizadas num gozo entremeado,
surrado, infeliz.
Seus mamilos valentes diziam quero mais,
numa lânguida agonia que nunca pedia o fim.
Descia por aquele dorso inflamado,
um tanto capenga, que um dia me serviu
e agora para nada mais se presta.
Vi seus olhos enlameados, rasteiros,
como poças de solidão dispersas e
surradas.
Suas pernas abraçavam as minhas
num tango mirrado que nos fazia chorar,
por vezes até orar.
Quando a virava de costas para me atracar
naquele néctar alucinante,
virava garoto, cuspindo meus cabelos
brancos para os confins do inferno.
Assim nos amamos numa réstia de
fugidos, num flácido folguedo que
uma dia chamamos de desejo.
Nos cravamos um ao outro
feito legado cabisbaixo de um viajante
fugaz, que agora não quer nada além
de um aceno, de um prato de fé.
Depois da folia, no deitamos como
reis após a farra, como foi bom, como foi...
Saímos daquele matadouro vingados,
um tanto bambos naquele chão escrachado
que fizemos da nossa cama.
Foi o dia mais nuclear das nossas andanças,
algo que nunca mais iremos deixar
escapulir uma fagulha sequer.
Morremos extasiados pelos vãos
soturnos de uma vida que agora
nem pó mais conservava.
Nos acabamos para sempre,
mas com as rédeas rasgadas,
os motins surrupiados e
a agonia ecoada grão a grão.
Grão a grão e nada mais.
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