O ritmo do tempo e das estações e das chuvas

o ritmo do tempo e das estações e das chuvas

afligem meu coração

pois,

se é a mim que o tempo pastora e envelhece

se é em mim que as estações doem a falácia de serem

flores, vozes de ventos, lassidão

se é em mim que as chuvas misturam-se à imponderável lágrima

e ao desalento que a existência imprecisa grita em agônica solidão

então,

o tempo, as estações e as chuvas

balbuciam presságios entre afetos e outroras

reavivando rumores arredios e histórias avessas

infiltrando-se por entre os nós vermelhos do madeirame do telhado a vista

enquanto a noite embebeda-se de ventanias lá fora

aqui dentro, ainda, a fumaça preta do lampião a querosene subindo

contorcendo-se conforme a brisa que trouxe a noite e se demora

por entre os sonhos e os pensares

por entre tantas sombras das minhas mãos e as de meus irmãos

e o cheiro do querosene cinzelando a noite

negando o farfalhar do tempo inconteste

subjugando-me

sobrepondo noites e dias

à antigas dores

e já não me compreendo quando a chuva cai das cumeeiras

como lágrimas chorando convulsas pelo chão do quintal

espargindo-se em redondas cismas de cristal

não sei em qual estação

me fiz flor narciso mentira jardim

passarinho em tantas vidas

metal pedra terra por fim

um ser imortal no que mais de mortal há em mim

não sei de qual manhã soluçante

veio a borboleta

o instante

e pousou na platibanda da janela

nos meus olhos

fascinando-se na vidraça onde se debateu

na enganosa transparência de um mundo que não era o seu