SEMPRE É TEMPO DE VOAR NAS ASAS DO TEMPO...
Sou ave ferida de luz em voo de ninho incerto.
Trago dúvidas nas asas, feito aquele avião
que nunca chegou ao destino.
- bomba caseira de um terrorista
explodiu todos os sonhos de quem viajava.
Assim também o tédio de um domingo qualquer
explode nas telas da TV os faustões e os santos sílvios de plantão.
Enquanto eu dormia a bordo de mim mesmo
tive pesadelos parecidos. Eu era cogumelo de
marshmallow e Hiroshima.
Vi um mar de gorilas rezando missas
e padres a erguer ao deus mercado suas hóstias de sangue,
e um homem de nove dedos nas mãos
a sonhar com três refeições ao dia para todos.
Quem de nós, simples mortais,
nunca teve um dia o sonho de ser pássaro
e voar, voar até a última gota do horizonte?
Existe um céu para além das canções do Nirvana
e deep forests para além dos descampados da vida?
Bebo o cálice de toda a incerteza e me espanto
de sextas-feiras já engolindo as expectativas
de um bom fim de semana.
Sábado serei o final de todos os começos.
E, no domingo, quem sabe terei os sabores
e os dissabores do início de todos os fins?
Sempre nos restam as segundas intenções
das segunda-feiras...
Mas por enquanto espero sentado no sofá da sala
que o Natal chegue logo.
Acendo o pisca-pisca da memória e enfeito a árvore
das lembranças tardias.
Onde está aquele menino que um dia fui?
Onde estão os amigos de infância que se perderam de mim?
As aves de rapina do tempo são cruéis.
E bicam e devoram cada centímetro do instante que se vai.
Resta-nos a busca de outros ninhos.
Mas fica-nos apenas uma certeza:
depois de tudo, restará apenas o pó. E a poesia.
E vento soprando por sobre as campinas.
Se ainda existirem campinas.
(José de Castro, jornalista, escritor. Autor de “Apenas palavras” e “Quando chover estrelas”. Escreve também para crianças. Membro da SPVA/RN e da UBE/RN. Contato: josedecastro9@gmail.com)