MEU ACENO VORAZ DE GLÓRIA
Gosto de tocar meu tempo
sentir seu sangue, sua fuligem,
seu gosto sem gosto.
Gosto de desnudar meu tempo
abrir suas trancas, acender seus foliões.
deixar tudo desarrumado,
desmamado,
destocado,
desnudo.
Gosto de camuflar meu tempo
suas nervuras misturar num molho só
suas garras alforriar
seus folguedos celebrar,
delícia.
Gosto de ludibriar meu tempo
suas pegadas confundir
seus ventres acudir
sua mão entender.
Gosto de flertar com meu tempo
esquecer seus donos, suas amarras,
seus engasgos sem anzol.
Cada teco de solitude submersa,
cada verso bizarro ensaiado
cada nuca novata abençoada
cada Deus distante atarantado.
Gosto de cuspir no meu tempo
afligir suas ventosas, seus porretes,
deixar cada grão enlouquecido,
prostrar as rédeas do meu canto surrado,
virar bruxa no meu curtume,
virar bálsamo no meu pelourinho,
virar rei na minha decantação.
Gosto de fecundar o meu tempo
deixar sua barriga crescer depois do mundo,
fazer seus fardos aluviarem meus gargalos,
deixar suas larvas sorrirem até morrer.
Romper cada farpa fugida que houver,
tourear as manhãs, meus torniquetes de fé,
rasas estrepolias deste pobre refugiado,
que agora encena sua maior fisgada,
meu canto de redenção,
meu aceno voraz de glória.
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