eu também vou reclamar

Para Raul Seixas


não aguento mais ouvir tanta reclamação
prestem bem atenção
reclamam dos impostos
da saúde pública e privada
reclamam da educação
da juventude desviada
reclamam da aposentadoria que veio
da que virá
e da que não veio
reclamam por reclamar
reclamam da coleta de lixo
reclamam da biblioteca
que o salário é uma merreca...

reclamam da fila para pagar
da fila para receber
reclamam de lá e de cá
reclamam de não sei de quê
que frio e calor são irritantes
reclamam dos livros nas estantes
reclamam de quem pede esmolas
e até dos que andam com sacolas
que as pessoas são frívolas...

reclamam do vizinho
do cocô de passarinho
a chuva é um tormento
a seca insuportável
reclamam dos alimentos
reclamam do automóvel
ora do preço ora da qualidade
reclamam da vida na cidade
mas viver na roça
picado por muriçoca
presta não
que é ruim a solidão...

reclamam da cemig
reclamam da copasa
reclamam comigo
e com a dona de casa
reclamam do computador
do televisor de plasma
até mesmo de uma pobre lesma
do telefone fixo e do celular
não param de reclamar
que em minas não tem mar...

até o vento incomoda
são chatos desfiles de moda
o cachorro que não para de latir
o gato o peru e o pavão
para tudo que existir
tem reclamação
e até o que não existe
nem sequer foi inventado
alguém sempre insiste
isso ficará logo estragado
dor de cabeça e nó nas tripas
bem melhor que tulipas
que horror pimba na gorduchinha
ripa na chulipa...

tudo ataca os nervos
o sangue ferve
as pernas doem
os rins corroem
reclamam do prefeito
reclamam dos vendedores
todos têm defeitos
corruptos e corruptores
empresários são sonegadores
reclamam do futebol
das cartas e dos cartolas
que a nossa seleção não decola...

reclamam das cartomantes
das escadarias
dos elevadores
dos fumantes e das tabacarias
dos andaimes
dos andares e andores
reclamam senhoras e senhores
reclamam alunos e professores
reclamam do médico
dos odontólogos e ornitólogos
que somos carentes de ética e de psicólogos...

filhos reclamam dos pais
pais reclamam dos filhos
que a culpa é do País
e das balas que furam vidros
reclamam dos netos e da buchada de bode
reclamam de quem fode
da macaxeira e até da erva-cidreira
como reclama esse povo
que a maconha é uma porqueira...

reclamam da cadeira de balanço
e do balanço das empresas
a fazer dos clientes suas presas
ouço e isso e me canso
o marido não presta
a mulher não trepa
o galo canta na hora errada
o sapo com a mesma toada
o grilo enche o saco
o vaga-lume ilumina o vácuo
o colchão é duro mole
e está mofado
que todo mundo está magoado...

diacho o cachorro fez xixi
reclama-se de tudo por aqui
reclamam da queda na bolsa
reclamam do furo no bolso
dólar subiu o dólar caiu
que o petróleo não é nosso
que hugo chavez é imbecil
onde já se viu?
a grande mídia não gosta do moço
reclama do presidente deputados e senadores
ah são todos impostores
e se fazem de valentes
com os tais vereadores...

a imprensa é mentirosa
só noticia coisas horrorosas
reclamam dos assaltos
reclamam de muros altos
que os sapatos não têm saltos
a previdência é morosa
reclamam do sutiã e das cuecas
reclamam dos carecas
dos cabeludos e sem pelos
que a vida é um novelo
novelas não têm zelos
reclamam da tinta de cabelos
que a vida virou uma novela...

e apelam para a ignorância
reclamam da abstinência
alimentar e sexual
reclamam da inteligência
reclamam da falta dela
tudo muito vulgar e banal
reclamam dos astutos
reclamam de João e Manoela
reclamam dos prostitutos e das prostitutas
que somos todos filhos da fruta...

eu também vou reclamar
faço questão de anotar
registrar em meu diário
estou falando sério
como é injusto o judiciário
de juízes misteriosos
feita as exceções de praxe
sejamos práticos
não proferem sentenças
entrar com ação na justiça não compensa
os juízes são apáticos
o que se espera de suas decisões
são sentenças à luz da constituição
que a justiça seja justa
com a cidadã e o cidadão.



poema do livro Palavras de Amor - página 12 - primeira edição 2010 - editora Biblioteca 24 horas




Aila Brito


Reclamar do judiciário
Já se ouve em comentário
Pela morosidade notória
Em finalizar essa história
Que até parece não ter fim 
Quanto mais mexe, mais fede
Parece mais necrotério
Envolto em triste mistério
De "aristocrata chinfrim".


Grato pela participação, Aila.

 Sô Lalá

Reclama do café frio
Do mal passado filé de lombo
Do rebaixamento do rio
Reclama até do pernilongo.

Grato pela participação, Sô Lalá