I
A professora deu um berro:
 

"Henriquêêêê, NOTA DEEEEEZ!!!".
 
Num tom que hoje eu reconheceria como:
 

"Nossa, que milagre que esse
menino estúpido tirou nota boa,
ei, vejam isso..."
 

E todas as crianças em minha volta
passaram a berrar também e a
bater palmas... Como se eu fosse um gorda
numa bicicleta.
 
Como se eu fosse
uma maldita criança obesa
sentada numa bike.
 
Eu já sabia que
alarde em cima de mim
me deixava com vontade de sumir...

Mas acabei sorrindo.
 

II
Em seguida descobri que podia
tirar proveito de minha boa nota
lá em casa também...
 
Pedindo a comida
que eu queria
Brincando durante o tempo
que eu queria
Dormindo

Quando bem entendia...
 
Flutuando em torno
de mim mesmo
cheio de orgulho.

 
III
Beijos e sorrisos...
Beijos e sorrisos...
Beijos e sorrisos...
 
E planos...
 
Planos dos meus pais
para o meu futuro...
 
Advogado?
Engenheiro? Professor?
O Presidente do Planeta?

 
IV
No dia seguinte...
 
A professora entregou
o resultado de mais
duas provas...
 
Valendo dez, eu tirei algo
como 0,9, 1,0...
talvez até menos...
 
Fiquei invisível novamente.
 
Minha mãe assinou a prova
com preocupação
tatuada em rugas,
 
traços na face
como se feitas
com hidro cor preto.
 
Fiquei mais tranquilo e
sereno...
 
Fiquei mais tranquilo e
Feliz...
 
Fiquei mais tranquilo e
sereno...
 
Aquela vida
vivida no dia anterior...
 
Era por demais cansativa.