AS IMACULADAS (ao poeta João Freire Ribeiro)

É pra você, sinhazinha, o meu canto neste dia

Sinhazinha, princesa, de neve, branquinha

Fala mansa, gesto de santa, tadinha

Que se casava com o sinhozinho

Tudo ao gosto dos pais, da família interesseira

Em manter e ampliar os tesouros da herdeira

Mas, sinhazinha sofria, de nada se sabia

Era amestrada, das mensagens uma pombinha

“pombinha branca, que estais fazendo? Lavando a roupa do casamento”

E se casava a menininha

E não se sabe o que ocorria em sua alva caminha

Entre sedas, cambraias, rendilhados, sianinhas

Eu canto o seu vazio de filhos preenchido

Pelas imensas terras, o sinhozinho emprenhava

As meninas pobrezinhas

Ah, sinhazinha, que a sociedade não se condói de sua vida parada

Organizando os jantares, ao lado da velha criada

O mundo em câmera lenta e sinhazinha conformada

Obedecia ao pai, ao irmão, ao marido, ao padre e a toda a velharada

Importava era o vestido de musseline e a mantilha usados na missa

Sinhazinha, contrita, ajoelhada

Ao lado de uma fieira de filhos, sobrinhos e outra gente aparentada

Para ser anjo foi treinada, a sinhazinha que de branca, ficou amarelada

Sinhozinho, de andar pela estrada, ganhou pele bronzeada

Cadê você, sinhazinha, que não mais avisto

Na igreja, vista baixa, rezando o terço, concentrada

Dona dos pecados sem culpa registrada

A sua vida começa e termina

Sem açúcar, sem sal, sem mácula, sem nada

Sinhazinha morreu acreditando que ficaria no céu sentada

Num trono de ouro e pedrarias

Junto de Nossa Senhora, a Imaculada