ATÉ BREVE


Nothing is lost.Nothing is so small
that it does not return.

Dana Gioia





Adeus, então, durando nossos gestos
  Distantes, já, e até ao derradeiro abrigo.
Que o eco desse instante seja breve
  E a dor, que por ausência compreendemos, sonho
Do qual nem traço ou cor ofenda o dia.

  Qual mensageiro de certezas que evitamos,
Dezembro chega pálido aos umbrais.
  As lições de esquecer que sempre aborrecemos
Sucedem taças triviais, um brinde
  À inépcia em simular tanta felicidade. 

Deixemos que em resgate dos momentos
  De brilho inusitado, da espontaneidade
Que era o escoar de seus sorrisos, flua
  A lembrança sem nódoa das coisas mais caras
Por serem, como a brisa, assim, voláteis.

  Não mais, aqui, teremos um do outro um toque
Que, por si só, dizendo tudo encerre
  De quem somos a essência em gesto e pensamento.
As minhas mãos pronunciarão seu nome
  No idioma de silêncios e querer do espírito.

Nos lagos de seus olhos, breve e austero,
  Esse que não me reconheço como eu mesmo
Insiste em seus apelos à vertigem.
  A queda ou salto a esmo tem no aceno vago
A deixa ambígua e, ao fim, profana prece.

  Adeus, sem qualquer lágrima a turvar o vulto,
O talhe exato de seu porte altivo.
  É desse seu partir que se instaura o futuro.
O imprevisto redime e há mais lembrança
  Em cada espera consentida que ascos mútuos. 

É o destino a aludir às mesmas rédeas
  Que tantos deixarão tão frouxas quanto possam —
No fim, reescreveremos o percurso
  Proposto, o afã de dar em parte alguma é imenso
— o fim do qual jamais escaparemos.

  Suporto a sugestão de seus vestígios vindo
Na sanha de calar sua lembrança.
  Eis o amanhã, todo recusas e conquista
Do que é mais nosso percutido ao outro.
  Há adagas e punhais nesse esquecer tão lento.

Os dias por sofrer trarão cuidados
  E a angústia de durar revigorada em tudo.
Não somos senão quanto reinventamos
  De nós mesmos, versões que o alheio olhar define.
Sabemos disso, agora, é nosso crime.

  Destrezas e procuras, nossa história um cúmulo
De espanto mútuo, portas sempre abertas
  E alguma comoção por tempos tão confusos.
O abrigo inusitado do discurso
  Foi o país distante de nossos troféus.

Adeus, deixemos que verdade e dor
  Mutilem quanto resta de quem fomos, hoje.
Ninguém dirá que vínhamos tão próximos
  Dum mesmo sonho, ultimamente — o que ficou
Desmente, em parte, o enredo em que sorríamos.

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Israel Rozário
Enviado por Israel Rozário em 30/10/2017
Código do texto: T6157418
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