EIS O HOMEM!

De que se queixa o homem, nesse dia?
Desceu ao mais profundo desses poços
Abertos entre escombros da utopia,
Tropeço após tropeço – não sabia
Onde daria aquela trilha de ossos –
Cumprindo itinerário de destroços.

Quem quer que o encontre errando meio e sorte
Desejará matá-lo, por instinto

Levado ao que parece um fim, seu norte...
Desgraça alguma além da que suporte
Será demais ao ressentido — extinto
O senso, equivocado diz 'Não minto!'.

Descendo, apalpa a escuridão mas sonha
O avesso dessa pesarosa trilha
Que pouco incômodo ou qualquer vergonha
Trará, por fim.Seu vulto é a mais tristonha
Ilusão do ideal – não há Bastilha
Alguma na diabólica armadilha. 

Queixar-se, agora, é inútil e sempre foi
Mais fácil achar culpados da injustiça
Sofrida, ver a si bem como é... dói.
Ressente-se e a mágoa que o corrói
É no argumento falho a má premissa,
Avesso de valor e fé postiça.

Duvidará de aviso e de presságio
Que ameace os cegos passos nos degraus
De rocha fria e bruta — como é frágil
Seu brio proverbial, já quase adágio.
Avança ao âmago dum novo caos
Sequer sentido, mesmo em sonhos maus. 

Quer tanto! Alcançará seu privilégio
Em tempo que o comporte e a seus iguais?
Que negros ventos sopram — sortilégio —
Nas câmaras do abismo? O sacrilégio
Assume ar de preceitos de 'normais'
Nas ruínas desse mundo que lhe apraz.

De que se queixa, então? A angústia é justa?
Assim, de perto, cede-se às vaidades
Das tramas duma nobre causa augusta.
Humano e por demais perdido, custa
Bem pouco errar, difícil é ver as grades,
Dali — e o Bem jamais virá em metades.

Querer no mundo espelho que o celebre
E reduzir seu mundo a mero espelho,
Eis seu equívoco, eis sua febre —
O mais suporta desde que não quebre
As frágeis construções de seu conselho,
Que abole o que não capta e o que acha velho.

Distância a devolver distância em passo
Que a pressa parcialmente justifica.
Não vai tão longe quem de si no escasso
Verão fugiu — havendo tempo e espaço
Há mais tropeços que a descida explica,
Ah, parcialmente, apenas, pobre dica.

Qualquer que seja o fim que o aguarda, adiante,
É em cegueira e loucura que o alcança
E pouco importa se ergue a taça ou cante.
O espírito já não tem paz, errante
Em terras de esquecer o que é esperança
A cada tombo estúpido...e ainda avança!

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Israel Rozário
Enviado por Israel Rozário em 26/10/2017
Reeditado em 27/10/2017
Código do texto: T6153808
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