LOUCO E MAIS UM POUCO
O poeta enlouqueceu!
Desde então
pôs-se na rua
dizendo que ela era sua
emprestou seu corpo à comunidade
começou a transformar a cidade
dizia coisas e coisas
aparentemente
sem nexo nem eixo
adquiriu superpoderes
de sentir e transformar
a tudo e a todos
:
poder de voar
correr rápido como o vento
de ouvir e ler pensamento
de sentir cheiros
sabe se lá de onde
com um olhar tudo transubstanciar
com um toque ou um gesto
tudo transfigurar
de se tele trans portar
:
todo poder que se pode imaginar
:
fez de um monte de entulho
reluzentes seixos
por onde escorriam
águas cristalinas
das crianças que
brincavam numa fonte
arcádicas ninfas
virgens e seminuas
ao atravessar a rua
feito Moisés
fazia o trânsito se abrir
por onde qualquer um
podia passar
olhava para o semáforo
e transformava vermelho
em verde
e às vezes até
em cor-de rosa
fazia das praças abandonadas
verdadeiros shangrilás
ou jardins de Alá
transformou um gari
evangélico
que gostava de cantar
num belo canário
transformou
pessoas transtornadas
que se cruzavam nas ruas
em correição de formigas
obedientes a uma ordem
que não sabiam de onde vinham
todo dia de manhã
fazia um círculo no ar
então o sol se fazia nascer
depois deixava-o morrer
e vinha a noite
ele desenhava a lua
e outros enfeites no céu
[isso nem sempre acontecia
só quando não se esquecia
ou quando tinha tempo]
só quando não se esquecia
ou quando tinha tempo]
as ruas não tinham mais lixo
o asfalto estava sem buracos
ruas atapetadas de flores
durante o ano inteiro
aboliu o prefeito
secretários
e vereadores
todos tinham casa
ninguém mais pagava aluguel
transformou grandes edifícios
em grandes árvores
cheias de casinhas
onde as pessoas moravam
transformou o skyline da cidade
numa verdejante cordilheira
as casas não tinham muro
sem muros sem consertinas
fome era algo que existia
só na televisão
como ficção
animais domésticos e selvagens
andavam pelas ruas
pastando por campinas
que surgiam do nada
bem na medida
que na rua pisavam
para onde se olhava
voavam e cantavam os pássaros
as pessoas podiam beber a vontade
sem virar alcoólatras
usar qualquer tipo de drogas
sem se viciar
fumar cigarros
sem perigos de câncer
abriu sanatórios
aboliu hospitais
abriu cadeias
e presídios
aboliu o que não considerava
felicidade
:
fazia isso tudo
sem nenhuma veleidade
de vaidade
fazia por necessidade
de Ser o poeta da cidade
:
mas mesmo assim
vinham e diziam
:
"Poeta você é Louco!"
:
"Como posso ser louco?
Vocês vêem o que faço:
já andei sobre as águas,
já multipliquei vinho, peixes, pães e água
já ressuscitei mortos
curei feridas
e isto
à vista de todos!
Como posso ser louco?"
Pensava ele
sem esperar repostas
Mas o que ele mais apreciava
que era o seu descanso
descanso de gente superpoderosa
era ir para o centro da cidade
vestido de um casaco de lã
e um chapéu de aba larga
subir em cima estátua do Anhanguera
para o vento tudo esvoaçante deixar
como se deve fazer
com um poeta romântico
então abrir os braços
e ouvir tudo e o que todos
falavam pela cidade
simultaneametne
e discriminadamente
não por bisbilhotagem
sim por prazer
de consumir as palavras
que viajam e se desperdiçam
pelo vento
Mas
depois de um determinado tempo
nada houvia
só um barulhento silêncio
que o angustiava
imaginava que podia ser
que as pessoas
não mais conversavam entre si
ou que a cidade não tivesse mais um centro
quanto a isso
nada podia fazer
pois superpoetas
não transubstanciam
o que bem não entendem
Foi assim até o dia
em que cima da estátua
endureceu endureceu
se fundiu e morreu!
Virou palavras
que seguiram
os rumores do vento
deixando como herança de poeta
uma cidade transubstanciada
em palavras
de uma superpoesia
fui ao seu enterro
para ajudar
no absurdo de o enterrar
mas foi um erro
pois seu solo
seu chão era o ar
o asfalto estava sem buracos
ruas atapetadas de flores
durante o ano inteiro
aboliu o prefeito
secretários
e vereadores
todos tinham casa
ninguém mais pagava aluguel
transformou grandes edifícios
em grandes árvores
cheias de casinhas
onde as pessoas moravam
transformou o skyline da cidade
numa verdejante cordilheira
as casas não tinham muro
sem muros sem consertinas
fome era algo que existia
só na televisão
como ficção
animais domésticos e selvagens
andavam pelas ruas
pastando por campinas
que surgiam do nada
bem na medida
que na rua pisavam
para onde se olhava
voavam e cantavam os pássaros
as pessoas podiam beber a vontade
sem virar alcoólatras
usar qualquer tipo de drogas
sem se viciar
fumar cigarros
sem perigos de câncer
abriu sanatórios
aboliu hospitais
abriu cadeias
e presídios
aboliu o que não considerava
felicidade
:
fazia isso tudo
sem nenhuma veleidade
de vaidade
fazia por necessidade
de Ser o poeta da cidade
:
mas mesmo assim
vinham e diziam
:
"Poeta você é Louco!"
:
"Como posso ser louco?
Vocês vêem o que faço:
já andei sobre as águas,
já multipliquei vinho, peixes, pães e água
já ressuscitei mortos
curei feridas
e isto
à vista de todos!
Como posso ser louco?"
Pensava ele
sem esperar repostas
Mas o que ele mais apreciava
que era o seu descanso
descanso de gente superpoderosa
era ir para o centro da cidade
vestido de um casaco de lã
e um chapéu de aba larga
subir em cima estátua do Anhanguera
para o vento tudo esvoaçante deixar
como se deve fazer
com um poeta romântico
então abrir os braços
e ouvir tudo e o que todos
falavam pela cidade
simultaneametne
e discriminadamente
não por bisbilhotagem
sim por prazer
de consumir as palavras
que viajam e se desperdiçam
pelo vento
Mas
depois de um determinado tempo
nada houvia
só um barulhento silêncio
que o angustiava
imaginava que podia ser
que as pessoas
não mais conversavam entre si
ou que a cidade não tivesse mais um centro
quanto a isso
nada podia fazer
pois superpoetas
não transubstanciam
o que bem não entendem
Foi assim até o dia
em que cima da estátua
endureceu endureceu
se fundiu e morreu!
Virou palavras
que seguiram
os rumores do vento
deixando como herança de poeta
uma cidade transubstanciada
em palavras
de uma superpoesia
fui ao seu enterro
para ajudar
no absurdo de o enterrar
mas foi um erro
pois seu solo
seu chão era o ar