MEMÓRIAS DO FILHO PRÓDIGO.
Quando meu pai levantava-se,
minha mãe já estava na lida,
eu me despertava aos poucos,
levantava com o mundo nas costas,
o café já estava disposto no
beiral do fogão,
as brasas reluziam sob as
panelas,
minhas irmãs dormiam como anjos,
o dia ainda principiava a nascer,
as estrelas iam aos poucos se desbotando
e se recolhiam no espaço de Deus,
meu pai então pegava a chaleira,
e depositava três ou quatro dedos
de café na xícara esmaltada,
pegava algumas quitandas
e fazia o desjejum,
depois enrolavam o cigarro de palha
e desligava-se do mundo observando
as nuvens se ajeitarem no céu,
enquanto isso minha mãe
fazia a marmita e enchia a garrafa
de vidro de café,
meu pai então pegava as ferramentas
e ia ganhar a vida,
lá fora o sol começava dar as caras,
minha mãe então me arrumava
para ir para a escola,
eu pegava o bornal de cadernos, e
ganhava o longo caminho
que me levava a escola,
curtos eram meus passos
e longos meus sonhos,
pensava no meu pai no eito
o sol queimando em brasas,
queria ganhar a vida com
menos sofrimento,
não eram poucas as vezes
que a imagem de minha mãe
me acompanhava neste longo
trajeto,
a via com seu vestido de chita
varrendo as folhas do outono,
pensava nas minhas irmãs
que em breve seguiam meus passos,
o sertão me ouvia com seus
ouvidos abertos,
eu sempre voltava com algumas
palavras a mais para eu expressar
a vida,
tanto tempo se foram,
hoje, eu tenho o mundo nas
pontas dos dedos,
mas a felicidade me escapa com
mais ligeireza,
o caminho do céu tem mais pedras,
olho meus filhos, filhos das vias
pavimentadas e da felicidade virtual,
tento ter a felicidade nas mãos,
mas ela não esta ao meu alcance,
me acostumei ser feliz nos contatos,
não me adapto e não tenho
pernas suficiente para acompanhar
a rapidez da modernidade,
refaço nos meus sonhos,
os tempos idos me banham,
me embriago neste momento
de recordações,
o sertão esta lá intocável,
eu tão distante com meus automatismos,
sei que ele me espera de braços abertos,
como um pai a espera do filho pródigo,
meus pais hoje mais velhos,
mas com a mesma intensidade
para nos amar.