Minha Mãe
Mauro Pereira
Dama sem posses e, no entanto, rica.
Cabelos longos sem nenhum retoque,
Presos com um lenço em rotundo coque.
Esta é uma imagem, que em mim, dela, fica.
Os pés, rachados de poeira e frio!
As pobres pernas, cheias de varizes!
Os dentes, reduzidos a raízes!
O olhar tão calmo como um largo rio.
De manhãzinha, antes da ordenha,
Tirava as cinzas de sobre o braseiro.
E tal e qual um fole de ferreiro
Gerava chama no fogão de lenha.
Assim a sua casa amanhecia!
Crianças sonolentas vindo à cata
De um canto de fogão, perto da chapa,
E dos quitutes mil que ela fazia.
Angu, mingau —jamais uma coisa só—;
Tutu, mandioca, broas de fubá,
Bolinhos de polvilho e muito chá,
Torresmo, ovos mexidos, pão-de-ló;
Leite fervido junto com hortelã,
Coalhada adoçada em rapadura,
Pele de porco frita e às vezes dura,
Tudo compunha o café da manhã.
Parece, a sua lida, fim não tinha.
Coser, cerzir, passar, pregar botão.
Cozer, servir, lavar, limpar fogão.
Cuidar de porcos, vacas, de galinhas...
Fervia a roupa num tachão de cobre,
Depois, batendo-a num pranchão lavrado,
Mais parecia os golpes de um machado
Ferindo o cerne de madeira nobre.
Sobre o assoalho, a sombra do portal
Marcava a hora de arrumar pra escola.
Caderno, livro e lápis na sacola,
E a merenda dentro do bornal.
Lembro-me dela a apartar terneiros.
Pegando lenha embaixo do assoalho.
Puxando a orelha de algum pirralho.
Tratando das galinhas no terreiro.
Dos mandrovás, o medo, até de vê-los,
Não a privavam de pequena horta,
Cercada de bambu, perto da porta,
Que ela mantinha com cuidado e zelo.
Por muito tempo achei que ela gostava
De comer asas e pés de galinha!
Soube mais tarde. Era o que sobrava,
Depois de alimentar sua turminha.
Sábia mulher que fez, por vezes tantas,
Parar no ar, sem mesmo erguer a voz,
A mão que castigava mais atroz.
Com tal furor que até contar me espanta!
Jamais a vi se divertir! Por Deus!
Sempre à procura de um-que-fazer!
Talvez até seu único lazer
Foi ver crescer os onze filhos seus.
Essa mulher foi muito em minha vida!
O berço, a luz,... De tudo uma parcela.
E eu te abracei tão pouco minha velha!
Meu anjo, minha santa: MÃE QUERIDA!
Patos, Mai/2000.
Minha Mãe