A escrita das folhas
Numa tarde de bençãos, como são as manhãs de chuva mansa e as noites com janelas, a voz de uma árvore canta aos meus sentidos e folhas se dão às minhas mãos.
Desconheço e dessinto um ser assim, aí, tão amador quanto aos folhas.
Sombreiam os corpos do verão; amam os ventos, nas tardes de outono; beijam o chão, nas manhãs de inverno e adubam as noites de primavera. Todos atos de pura entrega.
As folhas são doutoras. É como ensinam. Em-si-nuam, eriçam, rolam no chão.
Ali, na margem dos passeios públicos, onde a infância faz enxurrada e o amor são ruas em correnteza, cachoeiras nas esquinas, pedintes no sinal, as folhas segredam.
Um poema de folhas é bem mais vivo que uma tese. Na tese, as folhas morrem de asfixia.
E como é fina a pele das folhas secas, que aguardam com deleite o destino de arder ao sol e adubar as flores da estação seguinte. As folhas sabem que é tempo de florescer.
Numa tarde de bençãos, as folhas, em silêncio, interpretam meus sentidos.