Erasmo e Luis

Ele passa a noite regando o jardim engolido em uma espécie de satisfação carnal,

Ficava até as seis, logo tomava um café e entregava o jornal.

Era admirável a naturalidade com a qual levava o seu ofício.

Admirava-me o jeito que falava da vida como se fosse algo normal.

Uma vez me disse que estava cansado da noite e mudaria pro dia,

Noturno Erasmo vá com tudo engolir o dia,

Noite finda.

Nos complexos verticais com mais de centenas de famílias

Empilhadas e acomodadas em seus respectivos lares,

Saltava estranhas figuras habitantes de fortalezas edificadas em pares.

O rosto do vizinho a gente desconhecia, quem era a gente não sabia.

Mas no elevador que subia e descia não tardava a encontrar

Aquele mesmo que causava gritaria e levava tudo a desmoronar,

Até o misterioso morador que de tão simpático e solitário só restava imaginar.

E eu realmente imagino o que realmente é ser parte de um todo tão sem pé,

Criado pela democracia e pela economia esperado pra aparentar total sintonia,

Torna-se a nova interrogação do dia, a quebra da interpretação lógica já interrompida.

Meu amigo Luis que aqui vinha tocar viola na noite fria,

E regado a álcool e alegria tornava toda essa lama em argila.

Conversávamos sobre o condomínio e suas bizarrices,

E modelávamos com calma a realidade do modo que a gente queria.

E o mais estranho de tudo isso é agora mesmo ser brecado a teclar,

Sendo chamado pelo barulho estridente do celular, um assovio de arregalar.

Eu só não podia esperar que fosse o próprio, amigo do prédio e desse lugar,

Que por aqui tocávamos e falávamos de noites como essa,

Quietas, sólidas e sensatas perante todo o luar.

Onalim Andrade
Enviado por Onalim Andrade em 07/08/2017
Reeditado em 07/08/2017
Código do texto: T6076557
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