Seres vis não sufocam meu grito
Vidas se esvaindo em leitos hostis
Sórdidos facínoras em seus covis
Camundongos imundos em seus monturos
Ratos esbaldando-se em meu sangue puro
As vozes d'África em agudos tons
Ouvidos inglórios escutando os sons
Difícil dizer de horríveis momentos
Em que de imensas vagas sou o alimento
Em que ao vento vai meu assustado grito
Em que seres vis me vêem aflito
Mas não me canso de meu grito enviar
Não perco a esperança, não vou parar
Porque sou negro, sou muito forte
E vivo renascendo nos braços da morte
Mas a qualquer instante meu Deus vai chegar
E quando o meu Deus chegar
Vão ouvir meu cantar
E também vou falar
Vou falar do que vi, e do que senti
De como vivi, do quanto morri
Vou falar do que sou, falar porque vou
Vou falar do que fiz, porque também fiz
Fiz religião, fiz gastronomia
Política eu fiz, fiz sociedade
Cultura eu fiz e africanidade
Fiz música, dança e brasilidade
E eu também fiz, este imenso país
Mas eu sou um estranho
Neste país, que eu também fiz
Com inteligência
Também fiz ciência
E hoje faço com!
Ciência!
Negra!
No país em que vivo o tempo todo aflito
Porque seres vis não sufocam meu grito.