DIAS AMARELOS
Eu sigo a garota com o cisco nos olhos
E o menino que nunca foi popular
O orador gago e resoluto
Eu sigo plácido alguns dias e atento em outros...
Eu sigo a nuvem mais carregada e a trajetória que ela faz
Eu sigo os dias mais opacos e doentes...
Aqueles onde as coisas são etéreas e tristes
Aqueles onde elas passam como espinhos e seu entendimento é difuso
Eu sigo numa rota muito acidentada, cheia de mau-agouros
E onde só se ouvem reclamações...
Eu sigo onde os bem-aventurados nunca puseram o pé
Eu sigo na trilha da solidão e do silêncio
Eu sigo como o Pistoleiro sem Jake
Como alguém que seguiu em diante e passou por uma festa na qual não foi convidado
Eu sigo numa estepe gélida que antecipa a tundra
Eu sigo num vagonete veloz rumo ao desfiladeiro
Eu sigo o fim na esperança que ele me leve ao começo...
Eu sigo meus anseios na medida em que posso visualizá-los
Numa sensação aguda que me traga menos pesar
Eu sigo meus pecados na estrada dos tijolos amarelos até o mago
Eu sigo perseguindo o Rei que veste a cor da febre
Eu sigo por Carcosa e por R’Lyeh
Eu sigo até onde o vento se cansou e onde as cores adormeceram
Eu sigo minhas intuições conforme uma ordem ancestral
Eu sigo meus instintos até o pé do cadafalso
Eu sigo você em companhia e a mim em desgosto...
Eu sigo suas manias e sua imensa auto-estima
Eu sigo meus sonhos em meio às ruínas...
Eu sigo minha ética em episódios de total descrença
Eu sigo um líder totalitário que me recebe num espelho
Eu sigo uma grande memória...
Estendida e resoluta num tapete extenso
Eu persigo aquela coceira interminável que entorpece os sentidos
E vai até o âmago sem se perceber...
Eu sigo os anjos e querubins dos afrescos renascentistas
Eu sigo os ébrios nas tabernas
E as putas que não são mais atraentes
Eu sigo aqueles que se levaram por devaneios e se perderam neles
Eu sigo meus fantasmas e arrumo a casa para os mortos
Eu sigo a etiqueta dos funerais e a polidez dos esquecidos
Eu sigo o encanto das sereias
Eu sigo a credulidade humana
Eu sigo a ilusão da vida.