A metafísica do café
Perco-me, em certas manhãs,
Dentro de mim. Labirinto pantanoso
de incertezas, nebulosa penumbra .
Distinguo uma luz
Tangível, viva, real. Palpável
como a maçã que há pouco devorei com ferocidade.
E quando disparo em sua direção
ela se apaga. E acende-se novamente
nos confins do infinito contralateral
ao pífio espaço em que vigia e repousa
minh'alma e corpo.
E, desorientada, mergulho em soturno oceano
ébrio de solidão e angústia e dúvida.
E, dentro de mim, morro no ápice da existência.
Deixo meu espírito deteriorar-se
na inércia da incerteza profunda,
na perpétua morosidade da ausência,
na dissolução das trilhas delimitadas
por onde se pode seguir com certidão e
na plenitude do Ser dentro de si.
Invagino-me, torno-me em completude
submersa no Interno.
Degusto de etérea imortalidade, totalidade do Eu.
Torno-me Tudo o que há. Vivo tudo o que sou.
E fecundo infinitos questionamentos
Jamais respondidos
Mas que carregam em si resposta intrínseca: apenas por existirem.
Passo um café e nele
projeto toda a metafísica do Universo.
E sua borra, negra, molhada e seca
Esconde em versos indistinguíveis, incompreensíveis, inalienáveis
Todo o futuro da Humanidade.
Encontro no café novamente a luz
A luz vem
Ca fé.