A MÁ NOTÍCIA
A caixa de correspondência, vazia:
há uma greve na cidade
e a noite segue fria.
[... E o carteiro que não passa?!...]
Maria está morta no quarto...
[... E o carteiro que não passa?!...]
Dr. Ari fora taxativo:
– “Apêndice supurado!”.
[... E o carteiro que não passa?!...]
Sobre o seu peito imóvel,
feito cruz,
deitei-lhe os braços.
[... E o carteiro que não passa?!...]
Aos prantos,
velei-lhe à velas –
a meia-luz a santificava.
[... E o carteiro que não passa?!...]
Mães,
morrem sempre em noites frias!...
[... E o carteiro que não passa?!...]
Cercada por quatro círios,
tudo nela era paz.
[... E o carteiro que não passa?!...]
Na cidade em greve,
em meio ao frio, o dia dispara e
a caixa de correspondência segue vazia.
[... E o carteiro que não passa?!...]
Carteiros, em geral, nos chegam ao dia!...
[... E o carteiro que não passa?!...]
a Aurélia,
escrevi uma carta.
[... E o carteiro que não passa?!...]
Nela, disse-lhe da morte de Maria.
[... E o carteiro que não passa?!...]
Após desdobrá-la,
não sei como lhe baterá a notícia –
estranhos endereços, os de Dubai.
[... E o carteiro que não passa?!...]
Aurélia precisa,
com a máxima urgência,
saber do desencarne de Maria!...
[... E o carteiro que não passa?!...]
Aos Correios, ir, eu não poderia.
[... E o carteiro que não passa?!...]
Na falta de ponte aérea,
uma ponte pênsil,
construirei até Dubai.
[... E o carteiro que não passa?!...]
A casa está oca
e minha solidão em alta.
[... E o carteiro que não passa?!...]
Mesmo não a tempo para o féretro,
depressa,
tente voltar a jato!...
[... e o carteiro que não passa?!...]
A respeito de mamãe,
quando aqui você estiver,
eu lhe contarei mais detalhes.
[... E o carteiro que não passa?!...]
a greve geral quase ao fim,
e a temperatura ainda em baixa:
sem tambores ou sinais de fumaça,
de Aurélia, nenhuma notícia!...
[... E o carteiro que não passa?!...]
da mãe, ela se esquecera,
o mano, ela ignorara;
e como a greve dos correios ainda vinga,
vazia,
a minha caixa de correspondência segue em baixa.