BORRASCAS, ESGRÉTIAS E MORANTINAS
Sou palhaço e não faço segredo disso.
Atrás da minha maquiagem existem risos ainda imberbes, silenciosos.
Quando adentro ao picadeiro, faço valer as estrepolias que minha alma
guardou pra ninguém.
A plateia gargalha até se rasgar, isso faz meu nariz vermelho se agigantar como nunca, como nunca.
Sou palhaço, fazendo graça desta vida que me deram,
que me fizeram ser, que me fizeram decantar.
Meus sapatos desproporcionais desproporcionam meus encantos,
minhas folias, meus gingados de rebeldia áspera.
Faço graça das ferrugens que escorrem dos olhos estalados daqueles que só esperam minha vez de brilhar, exatamente como você.
Sou palhaço afiado, de voz esgarçada, de ternura ainda amamentada..
Sou artista estrelado, voando numa ribanceira aveludada, me tecendo feito hóstia agridoce, feito flocos de gergelim a granel, feito o que for.
Adoro os aplausos que pipocam numa deriva infinita, arcando o peso dos anos com embustes de cetim grená.
Sou palhaço porque ainda não desatei meus nós da alforria, porque ainda me digo vencido quando soltei os últimos guizos.
E hoje, assim, meio pangaré, meio rei, meio vagabunda, me vejo malabarizando cada um de vocês com estas palavras borrascas, esgrétias e morantinas.
Sem ter a mínima noção do que borrascas, esgrétias ou morantinas sejam de fato.
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