Luto

Falta em mim um pedaço de vida.

Faz-se tempestosa a ausência

Tormenta que dilacera e dizima e

Cega e emudece

Faz-me surda e logra-me os sabores,

Os perfumes e cores.

Rouba-me a vida.

Explode em infinito sem cor que escorre e rasga a face

E toma conta do corpo, da alma

E da calma: fecunda escuridão e dor.

Mostra-se deveras presente

Ininterrupta em

Sôfrego aperto desesperado

Que devora-me a morada de Brahman

E clama sem piedade sua existência

E permanência eterna e infinita.

Torna-se centro indubitável de tudo e o Tudo cria-se pois o É.

Lacera a razão que resigna-se em

Tornar escrava calada

Exausta.

Vã e vil.

E o coração, esta ignóbil célula que sente

(Sente e mantém sob tutela as rédeas da consciência e da ciência sem o saber)

Este explode em imensurável sentir.

Derrama e grita e ruge e berra em silêncio.

Luto comigo. Luto em mim.

Luto em espasmos e contrações desesperadas

E serpenteio-me em infindos impotentes contornos que não sabem onde encerrar tamanho padecer

E disso me dissolvo e morro.

O luto não é a morte do que vai:

o luto é a morte de mim.

Nicolle Ramponi
Enviado por Nicolle Ramponi em 10/05/2017
Reeditado em 05/05/2018
Código do texto: T5995498
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2017. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.