A HORA DOS MORTOS
Era assombração.
O corpo de Estela flutuava
como uma lua rebelde
sobre as nossas casas.
Fechávamos cedo as janelas.
Medo de quem já se foi
era o que sentíamos.
No entanto, nossos ouvidos
jamais escutaram
um só vagido que seja
da boca de Estela.
Mas tínhamos medo.
Medo do que rejeitamos.
Medo do que negamos.
Estela morreu em nossas ruas,
diante de nossas casas,
sob os nossos olhares omissos.
Morreu lentamente,
pedaço a pedaço.
E, por isso, tem ela o direito
de nos assombrar,
tornando as noites mais longas,
atormentando o sono
que teimamos em querer ter.
E quando chegar
o dia do perdão,
o que receberemos
da boca de Estela?
Bênção?
Maldição?
Ou o merecido silêncio?