Desafio
Devo encarar sem medo
Devo assistir sem medo
O roer das horas do VAZIO
Na hora da vida vaga
A vida planície imensa e silêncios
Nem mesmo o uivo de qualquer fantasma
Devo assistir sem medo
O roer das horas do VAZIO
Sem ler,
Sem fugir para a tevê
Ou para a confeitaria
Onde se vendem chocolates, menina suja,
Sem buscar no choro
Ou na palavra da Mulher
A condição que não consola
Devo assistir sem pena de mim mesmo
O deslizar das horas do VAZIO
Sem virar-lhe o rosto
Ou fechar-lhe os olhos
Encarando-o fria e fixamente
Estudando-o
Como se estuda o adversário no início do round
Pois que, apesar de tudo,
No seu ventre
Há qualquer coisa de resposta
Ou desafio ou uma prova
Da presença silenciosa de Deus
(Brasília, julho/1974)