POETA BESTA
Não me interessam as guerras do mundo,
Já tenho a minha,
Guerrear com palavras,
Com um povo que não lê,
Não é guerra comum!
Qual poema acabará com as trincheiras do atraso!
Qual frase fará levante!
Onde rimaremos nós.
Cidade... cidade... cidade!
Essa luta é árdua.
Eu deixo nas ruas meus poemas,
Ninguém lê!
Eu deixo meus versos nas fachadas das casas velhas,
Ninguém lê!
Eu deixo minhas rimas no meu corpo pintando, solto
Em todos os cantos, brechas, arvores...
Ninguém lê!
Nos copos dos bêbados,
Ninguém lê!
Na ponte do rio,
Ninguém lê!
No riacho salgado...
Na pele dos que se veste desta mesma terra,
No cais,
Ninguém lê!
Estranho,
Só em mim há poeira.
Poeta besta,
Invés de amar uma mulher,
Ama uma cidade.
Poeta besta,
Invés de luta como eles,
Luta com palavras.
É árdua essa luta!
Eu se fosse a bombas e a armas,
Talvez o poema silenciasse as ruas,
E o poeta quer só canta!
Quer flores...
Que vida.
Não, não há armas em minhas palavras.
Tão desnudo são os versos,
E cada rima me olhar,
Tão familiar.
Não, não...
Minhas trincheiras estão em Salgadinho,
Meus abatidos estão em Salgadinho,
As minhas viúvas,
As mães,
Os filhos,
Estão todos em Salgadinho,
“ Ainda cuido do meu rosto, nas lagrimas do meu povo”
Mas o poema,
Ninguém leu,
E parece que falo uma terra estranha!
Sem o nosso rosto,
Sem a nossa pele,
Sem nossos nomes,
Sina de poeta,
Luta bruta,
Luta justa,
Poeta besta,
Invés de lutar com as armas,
Luta com flores...
Poeta besta,
Invés de amar uma mulher,
Ama uma cidade!