Samaúma
I
Erguidos os braços peludos
sombreiramente sobre nossas cabeças
um enorme guarda-sol
vegetal
protege-nos
marca e orienta os destinos
viajantes pescadores marinheiros
protetora e mãe
de aves répteis
bromélias orquídeas trepadeiras várias
um miniecossistema de saudades
II
Quando sob o sol equatorial
nevam plumas na planície
numa metálica-esvoaçante chuva
as lembranças mostram-se traços
inconscientes
silhuetas leves
indo no vento, voando flutuando
no espaço e no tempo intangíveis
da memória
espraiando-se, disseminando boas novas
em dispersas nuvens
revoadas
a irem fecundar longes terras
no cio
III
No ar a ideia clara
de vida e beleza
tempo chuva rio
em nosso olhar amazônida
O vasto estético cogumelo
acústico abrigo de auriverdes
aves faladoras gritadoras
E cada manhãzinha acorda em festivas revoadas
Sobre o cogumelo à noite
um luar m´stico
num beijo lunar alimentando
a paisagem de lembranças indígenas
rituais tupimambás nas sapopemas
Morubiras
respondendo ao batuque ancestral
Puçangas amaldiçoando o agora
e seus técnicos laudos
Uma coruja murucututu
agoura nos galhos as motosserras
e as canetas que assinam
vis papéis... assassinos
IV
A floresta lamenta com dolência
Cajuís castanheiras siriúbas açaizais
pés de pupunha choram a irmã mãe-de-todos...
Tatus mucuras calangos
desconfiados
adivinham o fim trágico
e inevitável
Pena o trovão de Tupã
não castigar mais...
Verde copa
verdes ramos verde indo
verde ido
V
O silêncio desumano (des)mata a floresta
e a poesia
CURUMINS ESPIRITUAIS
agora estão à mercê do sol
abrasador
e
da
fria
chu
va da madrugada...
Adeus verde copa
verdes ramos verde indo indo
Verde já ido
O coração da mata já não pulsa
... em luto, a madrugada sopra fria