Rapsódia para o fracasso

“Then, what is life? I cried”

SHELLEY

I

Corri pelos campos gritando blasfêmias,

Perguntando aos deuses sobre a vida.

Desejei ausências, odiei mistérios.

Agora renego tudo, quero apenas viver.

Os homens cantam, dançam, esquecem.

Os homens morrem, desencantam e calam.

Só nos restam silêncio e vontade de gritar.

II

Carros oprimem,

Cidades oprimem,

Amores oprimem.

Permanece tudo quieto,

Tudo morno.

Tudo morto até que surja o ato:

A explosão da dor humana,

Daqueles que ainda não desistiram.

Então tudo ferve, impera o caos.

III

Casas queimando, crianças queimando:

Corações em chamas.

Olhos secos, sem lágrimas.

O choro virá depois.

Quando houver tempo

O choro virá.

IV

Cuidaremos da terra, ela sobreviverá.

Levantem os mortos, eles trabalharão.

Cuidaremos da terra, cantaremos,

Daremos flores às nossas mães.

V

Corpo: só existe o corpo.

A eterna potência, o bem maior.

O corpo não pode morrer.

Nos corpos repousam os deuses.

VI

Coberto por imundices, num gozo pleno:

A dor.

O hino absoluto: o grito!

Elas desejam viver.

Devemos matá-las?

Não, ainda não.

A tortura é o maior dos prazeres.

Ajoelhados, escravos de máquinas,

Criamos a nova divindade.

Pusemos o fracasso no altar.