Confissão
Eis que aqui estou
Diante de meu pai
||Novamente e será sempre
Pois resides tu na minha adoecida mente
- Engavetado! -
Que nem sequer à mim mente
Sobre a tua maldita e minha
Imunda semente...||
A confessar-lhe em prantos
Que eu te odeio tanto!
Pois que violaste tu
Todo o meu encanto
Dos meus recantos meninos
Da minha boca em jasmim
Inocente flor de mim
Que era suposto ser
Aquilo que eu nunca fui:
florzinha do teu jardim.
Olho de soslaio
E vejo a tua descarada cara
De morto-vivo tão vivo
E o vômito sobe à minha boca
E sinto-me suja de ti!
... Violaste tu a minha boca menina!
E a minha condenação
É ter-te nas minhas veias
É ter-te na minha mente
E passeares e rires cínico
Nesta minha dor-solidão.
... Pobre menina indefesa!
Ninguém viu!
Ninguém ouviu!
Mas todos bradam e falam
Do seu caminhar torpe e vil!
… Escandalosa mulher que aos errados ama!
- Mas e o que era certo em teu amor por mim que clama?!
Para que fosse certo em meu amar que é breve chama?!
E lacera-se a garganta minha
Num grito de socorro antigo:
… Ninguém nunca ouviu!
Mas ainda replica
Mas ainda ressoa
Mas ainda ecoa
Mas ainda escorre
Pelo olhar
De filha consolada nos braços do pai
Este onde ela se sente
Limpa, leve, justificada.
Sua flor menina e amada.
Eu não preciso de ti.
E cuspo a tua cara maldita!
E entrego-te a todos os infernos meus!
A todos os descompassos meus!
A todas as dores minhas!
É tudo teu!
Brindas tu, então!
Nos infernos todos teus!
Do teu viver hébrio e parco.
Anárquico!
Da minha existência opaca...
Desta que, um dia, perdoa-te
E tão somente a ti.
… Confesso e repouso em teus braços, pai.
Amoroso e materno. Imutável e eterno.
Karla Mello
11 de Outubro de 2016