Meus Santos

Meus santos não são de altar
São feitos de terra, são ocos
Mas não carregam ouro dentro de si
Meus santos foram abatidos a tiros
O novo chicote do opressor
Meus santos são rasteiros, frágeis
Fragilizados, azarados, cotidianos
Periféricos, feridos, feios e pretos
Meus santos não são de falar
Mas gesticulam e dançam e dançam
Num batuque louco, mas são moucos
Eles olham e não entendem a crueldade
São de pouca idade, quais anjos meninos
Meus santos são meninos bem distantes
Daquilo que se conhece como meninos
Não levantam cedo, dormem tarde
E a noite todos sabem os gatos são pardos
Meus santos não são de chorar, mas chorados
Estão por toda parte, eles ardem nos becos
Nas descomposturas de serem renegados
São de peles morena-preta-azulada-vermelha
Meus santos não são alunos, não temem o futuro
São feitos de parafina, lança-cocaina, balas-clicletes
São de uma pureza latrina, são de ossos quebráveis
São de uma coragem inquebrável, são cárceres
Meus santos não são hospedes, nem tomam hóstias
Soam horríveis para a linda sociedade
Meus santos não são santos de santidade
São moleques descalços, são meninos de barro
Crescem e viram homens-quadrilhas, vendedores auxiliares
Crescem e viram pais-crianças, demovidos de lembranças
Crescem e não viram nada, são escolhidos para serventes
Crescem e são banidos mesmo antes de serem aceitos
Crescem e viram anjo mesmo antes de serem meninos
Meus santos não são de altar nem de missas
Mas recebem missas do sétimo dia

Milton Oliveira
Outubro/2016
milton milo
Enviado por milton milo em 28/10/2016
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