ERA DO JÁ ERA E DA TAPERA


[texto inacabado,
por confessa preguiça,
ou porque não pode ser falado
e não poder ser passado
seu ancestral sabor
endomingado

falta alguma coisa
não sei o que é
talvez uma lata
de Óleo Heloísa
cheia de bolas de gude
enterrada no quintal]
 

 


 


aceito o convite
e entro...
estou dentro

um lugar ancestral...
a velha
casa rural
fica em lugar
central
entre
a horta
o curral
o paiol
e o quintal
antiga quinta
hoje idade
já é tanta
que nela
já iniciou
a era
e a seca hera
no muro
na parede
da tapera
e na cerca
do já era

mas se
se abre
a porteira
tem-se a porta
extenso portal
para o imortal
e sem igual

muitos quartos
apartados em aparta
m
e
n
t
o
s
choros
e cheiros
de desejos
que foram mortos
em apertos
o
c
u
l
t
o
s
outros lustros
nos mesmos claustros
íntimos cultos

sala de visitas
local de poucas
vistas
é só um hall
depois que cruza
do tempo do antes
tosco portal
patri
a
r
c
a
l...
madeirames arcados
de tão de antes
de tão antigos
e arcáicos

na sala
de visitas
visitantes poucos
desses tempos
de antes
para esconder
nas covas
e das alcovas
sem janelas
as moças novas...
haréns cerrados
gineceus
serralhos
de virgens
de verdes
anos
como
imagos sagrados
que não é de ver
nem tenro fruto
de se comer
era preciso
o tempo durar
e ao fruto
ma
d
u
r
a
r
casa
galinha choca
onde se escondem
os pintos dos gaviões

vem a copa
com sua copiosa
cristaleira
cristais
vidros
porcelas
por certo
inglesas ou
fabricadas na China
copa escondida
sem janelas
mas que se abre
a quatro portas
com extensa mesa
ornada de toalha
de renda
e frutas de cera
na parede
embaçado
espelho
um carrilhão
marcando o momento
da refeição
uma Santa Ceia
copa inválida
que não sabe
o que é comida
que só na varanda
ou na cozinha
tem guarida
e é servida

antes da cozinha
um lavabo
que dá ao lugar
um ar nababo

só então
vem a cozinha
onde faz cem anos
um fogo arde
uma chama
um braseiro
bem brasileiro
muito antigo
que queima
desde quando
Getúlio Vargas
ou até Epitácio Pessoa
ainda eram viventes
ainda presidentes
ali a imensa mesa
gasta pelo uso
do tempo
onde já jantaram
e almoçaram
milhares
de pessoas
de uma mesma família
cozinha três paredes
toda aberta
generosa
para com a área
externa
e dentro dela
tem até uma
cisterna
cozinha terna
e eterna
é cozinha
para toda banda
que se confunde
com a varanda

varanda
escancarada
para o fundo
e aberta para um
interno mundo
onde oscilam
balançam
cadeiras de balanço
e imenso bancos
feitos de cedro
ao lado de uma bica
feita no cerne
de uma tora de angico
cortado no mato
em 1925
bica
escorre
para fora
até sua água
mover uma roda
de velho moinho
e depois cair no colo
de um monjolo
que pila café
descasca arroz
faz farelo
para os pintos
fuba
para o angu
e prepara milho
para a canjica

separado da casa
um imenso cômodo
feito de adobe
meio mole
que do tijolo
de largura tem
o dobro
de telhado
datado
detalhado
pelo talhe
de picumã
janelas losângulo
quatro tachas
de cobre
compradas
e pagas com cobre
de um grupo
cigano
que todo ano
acampa
na beira do rio...
fazer farinha
fazer sabão
conzinhar vaca
e porco
fazer
doces
de figo
de mamão
pau de mamão
e leite
para o deleite

o resto
entre a casa
e o empalmitado brejo
é tudo quintal
que margeia a casa
indo até o paiol
e á beira do curral
um jardim
bem sofridim
meio chinfrim
perto do rego
e do imenso
e metálico
carneiro
um pé
de beladona
de flor
coposa e bobona
mais distante
pés de hisbisco
com flores sem vergonha
todas bem vermelhas
as onze horas
que nasceram
conforme
a vontade
do vento
misturadas
em sem_ver_gonhice
em meio aos beijos
com todas cores do arco-íris
que se esparramam
até as paredes
do cômodo
da desnatadeira
e da banca
de fazer
queijo
vem as rosas
filhas de velhas mudas
vindas de Minas
de canelas grossas
multicores
e multicheirosas
tem a horta
nas águas
meio morta
na seca
plantada até a porta
almeirão
abóbara
pepino
pés de couve
pés de taioba
de fora da horta
resta só pomar
de fruteiras
e outra bobeiras
um extenso e verde mar
larangeiras
mexeriqueiras
abacateiros
pés de romã
de pitanga
caju
cajamanga
manga
jaboticaba
goiaba
um mundo
que frutifica
e não acaba
na beira da cerca
que dá para o pastim
dos bezerros que berram
tem até um pé
de jatobá
e um de
cobiçado
ingá.
.
.
(...)
retorno
para dentro
da casa antiga
casa ancestral
onde nunca tinha ido
mas muitas vezes
tinha lido
pois sou apenas
mero convidado
para visitar
esse mundo
já meio acabado
é a primeira vez
que eu o rezo
e assim meio roído
o prezo

esse primeiro ver
não é conhecimento
é sim reconhecimento
de um mundo sem fim
que se acaba dentro
de mim

então chega a hora
de picar a mula
ir embora
pela estrada afora
ciente de que
esse aqui
já não é agora

(...)



[texto inacabado
adequado
a um mundo
já acabado]