A GRANDE NOITE
A Grande Noite se espalha como fumaça
e nossas peles contritas, num espasmo
escurecem cheias de dores recém-acordadas
e chagas plantadas agora, nascidas nesse instante
A Grande Noite é longa e mais negra, e mais densa
que todas as outras noites
nela cabe o estupor, o medo e todos os pesadelos, juntos
despertando o assombro naqueles que tinham dormido sob o sol
e em tantos que permaneceram em vigília
A Grande Noite não perdoa, ela é um trator que arrasa a terra
é como uma grade que nos cerca
um pavio apagado, um navio à deriva, um náufrago
um véu que cobre o céu de maneira tão completa
que sequer é possível observar o dia do outro lado
A Grande Noite mente
diz que o dia não existe
conta que as fantasias são pesadelos
que não há lua
que não há outra noite, além dela
a turba atônita acredita e venera e dá graças
À Grande Noite
empunhando tochas, tocos de velas, palitos de fósforo
devotadamente
na esperança de viver e morrer sob seu manto compacto
A Grande Noite abraça, afaga
e determina
que seu nome é Dia
(e, tolos, todos acreditamos)