Praias anoitecidas

acordo,

penso em você

e sinto a solidão das palavras que para ti guardei

e com as quais espero pelas tímidas noites sem cores

penso aonde eu estaria

neste dia e nesta hora

se meus braços não tivessem

enlaçado a tua cintura e os teus gestos?

aonde eu estaria se meus olhos ainda soluçassem

a tua ausência e o teu silêncio

e a minha boca passasse as estações

sorvendo o mel que era a tua primavera?

ainda é abril na clausura das rosas

nos regatos consumidos pela mudez das tardes

pela solitude dos ventos

ainda é segredos na inexorabilidade do outono

que dorme sob a bruma da paisagem

aonde cantarão os pássaros afogueados que entram em mim

e a vida se aquece cheia de encanto

ainda é demora a palavra que te conhece

e que ainda vibra em minha pele

e diz teu nome junto ao instante imperceptível

que entra pela minha janela

vagarosamente

acendendo sombras irreveladas

penso...

aonde eu estaria

neste dia e nesta hora

se o amor é vasto e louco

e basta apenas um pouco

destas águas afogadas em palpitações

e entrega

e esquecimento

para transbordar como um rio que cansado acha o mar

levando o choro das faces

e trazendo o afago na volta

do marulho do tempo a passar

aonde eu estaria

neste dia e nesta hora

barco sem vela

mares demorados

areias ancoradas ao destino

olhos cansados

as mão presas ao passado inexato

que envelhece interminavelmente

não me procures

esquece-me dentro dos espelhos

dentro dos porta-retratos

lança-me ao exílio dentro de garrafas

nas praias anoitecidas

nos silêncios

fugidios das perguntas

ocultando sílabas dolorosas

cortando o ar

não diga adeus

não faça loucuras

esquece-me

que escolhi para morrer com os versos condolentes

recitados por uma imprecisa madrugada

eivada de ternura