poesia
ÁRVORE ADENTRO - Octavio Paz
Cresceu em minha fronte uma árvore.
Cresceu para dentro.
Suas raízes são veias,
nervos suas ramas,
Sua confusa folhagem pensamentos.
Teus olhares a acendem
e seus frutos de sombras
são laranjas de sangue,
são granadas de luz.
Amanhece
na noite do corpo.
Ali dentro, em minha fronte,
a árvore fala.
Aproxima-te. Ouves?
De acordo com Stéphane Mallarmé, um poema não é feito com idéias, mas de palavras. Essa é uma questão das mais vitais para se compreender o que é a poesia. Claro que esse pequeno empreendimento não será suficiente, mas qualquer clareza nessa questão é um achado para aqueles que escrevem ou apreciam a poesia.
Por que a poesia não é feita de idéias, mas de palavra? A poesia é antes de tudo, um anti consumo, ou seja, não se pode encaixa-la numa ideia, algo que reunido em palavras se torna uma realidade do pensamento. A poesia é feita com palavras, porque pra ser poesia, é necessária uma honestidade do poeta, que sua experiencia interior seja traduzida de maneira mais próxima possível em termos formais à sua realidade. E isso é fácil de compreender, pois sabemos que as experiencias do corpo, dos sentimentos, da vitalidade, é sempre singular, preservando uma nuance ou outra como repetição. Expressar uma experiência viva e nova numa ideia seria empobrece-la ou manipula-la para caber nessa caixa fixa, que é a ideia. Por isso, é imprescindível conhecer palavras, muitas palavras, em seus diversos significados, com suas ramificações, tanto em sua materialidade, sua parte denotativa, como nos seus significados, que sempre podem ser enriquecidos, a conotação. Um poema pode ser trabalhado com elementos de imagens, tanto visuais, como sonoras, como linguagem discursiva, e também o aspecto musical. Claro que esses elementos não são excludentes, mas frequentemente estão presentes as três formas, um poema pode ter todas essas características, fato presente na maior parte dos poemas.
agora quero falar da imagem, especificamente a visual, um recurso muito usados, desde os haicais de Bacho , até grandes poemas universais como o poema sujo de Ferreira Gullar.
No exemplo acima cito um poema do Octávios Paz, um poeta mexicano ganhador do nobel em 1992, que traz uma bela imagem que nos ajudará compreender a imagem.
A experiência real, claro, não é uma árvore, é a interioridade do poeta, mas sua expressão nos remete a uma árvore, que nos aproxima através de algo conhecido à experiencia do poeta. A matéria prima do poema, é a vida interior do poeta, mas essa não é traduzível pela linguagem, fato bastante difundido pelos teóricos da poesia, mas a destreza do poeta, é faze-la chegar aos leitores de uma forma que seja compreendida e assimilada como uma experiência rica de sentidos.
A imagem não é a coisa, mas traduz algo de sua essência, de sua estrutura, é como se fosse uma representação imaterial da matéria. O poema é sempre uma transcendência, pois a partir do imanente, ou seja, daquilo que compõe o corpo evidente e intransponível do universo do poeta, ao qual está preso, a sua vivência, para o transcendente, um distanciamento que fala mais da coisa do que a coisa mesma pelos recursos da linguagem.
Olha como ele fala das raizes como o entranhamento do mundo interior, das folhagens como o pensamento e como o outro acende essa mesma árvore. E como ele define a existência dessa árvore interior à experiencia afetiva que o outro desperta, exatamente como a árvore real que existe (que acende na consciência) na medida que dela tenho percepção. Essa similaridade entre a coisa e sua expressão que torna a imagem compreensiva. É um poema que não necessita análise ou discursos elaborados para compreende-lo, basta que saiba o mínimo de como se dá a experiencia no sujeito e de como essa tem paralelo com a estrutura de árvore real (a imagem não precisa existir na vida real, pode ser algo absurdo ou surreal) . O estalo de compreensão é imediato, e dai a riqueza e a efetividade da imagem. A imagem pode ser similar ou apenas uma sugestão. A grosso modo é uma visão despertada, uma clarão de evidência, e o efeito poético é também imediato, pelo desvelamento do óbvio. É uma luz que acende instantaneamente. E o entendimento não é discursivo, a própria imagem é a revelação. É simples perguntar depois: por que nunca enxerguei isso? simples, porque nada na realidade o havia mostrado, somos seres de informação, e vemos mais e melhor na medida que sabemos.