O VINHO CULTURAL
Luzes de tão imensurável beleza,
em sonho de acordado sonhador,
claridade de irreprovável leveza,
ao tocar-te em todo teu esplendor.
És a minha amada cheia de pudor,
agora merecedora de meu amor.
Se aqui és como flor fortalecida,
ao consumir-te com tal orgulho,
tua gente não está amadurecida
e em taças e copos há o mergulho
da alma sedenta a jorrar calor
em repetidos goles deste sabor.
Bom sábio no culto à parreira
para consumir seu nobre vinho,
jamais precisará fazer carreira
pra tê-lo qual rosa sem espinho,
com fragrância ao seu olfato,
quer em bar ou em casa, é fato!
Nesta sã ocasião tão grandiosa,
teu nascer é sutileza laboriosa,
tua arte colossal é bem virtuosa,
tua geração é muito majestosa.
Teu processo é grande segredo,
cujo detalhar foge deste enredo.
Pela perfeição que não temos,
pagamos o castigo por morar
longe e doidos por ti sermos,
por teu preço termos de pagar.
– Ter de bancar teu alto preço
a quem não nos tem apreço!
Neste lugar em nada caseiro,
há o cantar do canto matreiro:
povo do saber, gente da vez,
tem o poder do mundo, talvez
se ao pé da televisão se plantar,
e com nada jamais se espantar.
Todavia a realidade é cultura
ou profundo saber dito singular
e nisto não há jogo de cintura:
precisamos de pesquisa regular
para penetrar em nosso vinho,
qual um pássaro em seu ninho.
No vislumbrar desta aventura,
nossas bocas ficarão úmidas,
nossos corpos sentirão quentura,
nossas línguas não serão tímidas:
o nascer de um poder natural,
que no mundo é dito cultural.
E nestas terras vamos cultuar
o costume do vinho na mesa;
dentre tantas bebidas, pactuar
qual padre na missa que reza
por todos e só por sua igreja
– “que minha ovelha me reveja!”
Nosso vinho em nosso viver
diário e se alguém o quiser,
como irmãos vamos ofertar
primeiro a quem não o tiver,
pregando-o como em sermão
este maravilhoso ato cristão.
Salvador, 15/03/2009.