Desce tão perto dos olhos a serra

Desce tão perto dos olhos a serra

que depois dela, depois do de lá do traço dela

do mundo nada nos chega

e no vão dos braços erguidos da encosta

descansamos.

No grito firme do sol

afasto a lembrança da noite

afugento da memória a tristeza fundamental

e rabisco no relevo alto dessas linhas antigas

a face de um deus cansado.

Se deito a vastidão da paisagem

inclinando o ombro

adivinho uma nascente

salto de cachoeira...

A serra é um dorso prologado

uma dobra na terra

a montanha de pedra ergue-se

em nódulos acumulados

as folhas das árvores revestem

a nudez da pedra na encosta

franja iluminada, a manhã é fóssil sonolento.

Desdobrado o testemunho das alturas desse olhar,

desço para o vale e mergulho...

O mar de ondas verdes continua

e eu, sem mistério, reinvento

o oceano que há muito secara.

Baltazar

Baltazar Gonçalves
Enviado por Baltazar Gonçalves em 17/07/2016
Código do texto: T5700938
Classificação de conteúdo: seguro