Poemas de bolso

Ao inventar a verdade

a mídia estupra e mata

sem maldade.

* * *

O poema acabou a festa

radical como um tiro

na testa

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Desejo/beijo

morrendo à míngua.

Só entendo

se você falar

na minha língua.

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Alma rebelada atoa

o poeta tem seu próprio tempo

e voa

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Súbita sucumbência

morrer é uma arte

e insólita ciência

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Solidão sem janela

assim mesmo o medo

espia por ela

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A Grande Máquina mói

e aniquila sonhos

mas não dói.

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Indefinível grandeza

a mão que separa o átomo

é a mesma que põe a mesa.

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Pobre liberdade

espremida entre a fome

e a necessidade.

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Droga sem bula

a poesia espera

quem lhe engula.

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O homem que não sou

e que não fui

contempla a vida e rui

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O relógio partiu

o dia ao meio

e deglutiu.

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Impotente poeta

a rima se oferece

ele a deixa quieta

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Sádico fato

o rato faz da rata

gato e sapato

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Como um cão danado

uivo para uma lua morta

desesperado

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História datada

chorou ao nascer

por nada... por nada...

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Driblou a fé

chamou de “joão”

Deus e Maomé

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Em dialeto

passionês

serei discreto

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Passional

qual Pierrot

no carnaval

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A nostalgia

do gato-tempo

me acaricia

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Disfarço o verso

com intenções

que não confesso

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A vida corre

de rio abaixo

que mata e morre

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Arte é aquilo que escapa

da vã inércia

na quente chapa

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Na jugular

a mãe leoa

cuida do do lar

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Tantas... tantas fiz

que fiquei preso

no círculo de giz

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Resolveu radicalizar:

fiado, só depois de amanhã

e olhe lá!

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Nau dos insensatos

afoga os deuses nas alturas

e salva os ratos

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Pintura em pleno ar

borrei de azul-desejo

o gás vital dela respirar

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Um navio desatraca

na amurada, a morte

amola a faca

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Anjo da guarda batendo

eu não estou nem aí

vou cuidar dos meus pecados.

Era um anjo encouraçado

mais pesado que o ar

não decolou, o coitado!

* * *

Como um ato falho

cortei a vida

feito baralho

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Não quero mais brincar de puta

disse a menina-objeto

ao cafetão, e foi à luta

* * *

Preciso começar de novo

preparar a eclosão

dentro do ovo

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Nênia para minha vó

negra-índia-suburbana

caiapó

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Taquicardia

morro-vivo-morro-vivo

todo dia

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Cruel dilema:

socorro a clara

deixo que gema

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Com medo de dar bandeira

o mastro de sábado

levantou na sexta-feira

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Bio-anorexia

Sem apetite

De comer a vida

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No vaso sanitário

um rei sem trono

defeca antimatérias

Fábio Mozart
Enviado por Fábio Mozart em 03/07/2016
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