Formigas e cigarras
Valha-me Deus de um pesçoco forte
Qual o das formigas
Que suporta carga maior que o corpo
No que se leva à boca.
Que sou ainda menor
Na imensidão do universo
E o que sai da boca tem mais peso
Do que se come.
Quando se escreve, então,
O pescoço há que dobrar
Como a própria literatura
Que vive de ser nas dobras do real.
Valha-me ser flexível
Como as pequenas também crianças
Que esticam e encolhem o mundo
Fadado aos sonhos sem cabimento.
Mas livra-me Deus da censura
Fabulante contra as cigarras
Que o poema é o próprio canto
E eu não quero viver sem cantar.