Estância em Glaura
Isabel era irmã de Olívia
Que era filha de Ana Luíza
Irmã de Carol
Que talvez seja Ana Carolina
Também filha de Ana
Que foi casada com Aluísio
Drummond como o poeta
Que inventou de voar.
Ana Luíza casou com Arthur
Que era irmão de uma moça
Cujo nome eu não soube
Mas nos cabelos de quem
Eu testemunhei um poema.
No quarto fechado
Arrombado ao acaso
A escova penetrava os fios
Dos mistérios
Luminosos e gloriosos
Gozosos e dolorosos
Que sempre guardam a poesia
Indizível e indecifrável.
Aquela moça era um poema
E havia uma metalinguagem
No ato de escovar seus cabelos
Quando o moço semelhante a Deus
Em sua divina humanidade
Também se fez poeta.
Poema gerava poema
Escritura sobre escritura
Fio a fio
Verso a verso
Transversos
Que a poesia não é linear.
A poesia corta o horizonte
Como um sonho que atravessa
Da janela do quarto escuro
Ao quintal de Don'Ana.
Eu não conhecia Don'Ana
Que era mãe das Anas meninas
Que eram amigas da minha amiga
A causa aparente de ali estar.
Mas o que move é sem evidência
E nossos nomes se encontravam
Nas Anas que são sempre graça
E na graça expandida daquele quintal
Repleto de bananeiras
Dançantes no cosmos
Donde se via uma porção de umbigos
Reiventando o mundo.
A placenta da terra
Nutria-se da seiva das árvores
Enquanto o sangue circundava as raízes.
Havia uma árvore genealógica
Plantada no coletivo dos olhos
Sobre as jabuticabeiras
E uma multiplicação de mãos e manhãs
Nos canteiros cantantes
De melodias e acordes
Mel de dias inteiros
De abelhas e gente em florescimento.
Era véspera de batismo
Mas tudo estava como na poesia
Prévia e divinamente batizado
Mergulhado de vida e criação
Naquela estância de instantes vivos
Sob a glória do céu de Glaura.