IDENTIDADE APÓCRIFA
Sabe, acho que em mim habitam espíritos diversos,
Pois para cada pensamento se manifesta nova ideia
E o mais estranho: cada qual com índole própria e
Personalidade heterogênea... Do caráter, nem falo...
No fundo sei que sou eu mesmo, mas com rompantes
De identidades distintas como se houvesse em mim
Individualidades capazes de assumir atributos vários.
Atento fico em todos os instantes: vejo-os, analiso-os
Em essências particulares e me sinto confuso, atônito!
Num mesmo assunto há posições diferentes... ora me
Levo a refletir dum modo, ora tudo muda, sinto-me
Em outro quadrante de raciocínio e, tudo isso, num
Passe de mágica, questão de segundos. Ouço vozes lá
Dentro como se estivessem a discutir, trocar ideias...
Fico sem ação na central da consciência. As sucursais
É que deliberam as atitudes a serem tomadas... Ah!
Isso é um incômodo, uma incoveniência. Tenho de
Assinar, endossar as deliberações e me comporto como
Se fosse eu um verdadeiro robô, sendo, sim, programado
Para agir de acordo com as resoluções conclusivas... Ave!
O pior: na maioria das vezes nem estou de acordo com
O que é resolvido, porém percebo uma ordem que vem
De dentro para fora: “Obedeça, não há como replicar...”
Pareço um fantoche, um bonequinho de marionete nas
Mãos e nas inteligências que me comandam... Embora
Eu saiba que seja eu mesmo, é como se não fosse. Não
Sei se é assim noutras pessoas... Talvez em outros corpos
Tais seres, se é assim que posso chamá-los, não encontrem
Tanta liberdade de ação... Em mim o campo é aberto, usam
E abusam de minha paciência e, até, de minha ingenuidade.
Engraçado, também, é que riem, choram, sentem tristeza,
Contudo noto que há momentos de felicidade, raros, mas há.
Não sei o que fazer. Quando tento uma coordenação, ah...
Aí é que a coisa pega! Subordinam-me de uma maneira que
Minhas adições somem, apenas adversativos imperam, fortes!
Jamais me acostumarei com esses intrusos que vivem a
Sufocar-me. Necessito de ser mais eu, ter fortaleza e, sem
Piedade, expulsá-los! Será uma longa e tenebrosa batalha!
Não! Será mesmo uma guerra, campo de raciocínios mortos,
Porque hei de pôr um ponto final nestas invasões e lutar
Com todas as armas de que disponho. É preciso muita vontade,
Controle emocional, conhecimento de causa e voltar a respirar
Meu próprio ar. Minhas paisagens hão de ser, outra vez, cognitivas!
DE Ivan de Oliveira Melo