Folha de papel em branco

Em cada canto da casa

Um pedaço de vida

Um pingo de história

Uma parte de mim

No quarto de parede mal-pintada

Existe uma escrivaninha marrom empesteada de cupim

Ninguém imagina que sobre ela

Os lápis de cores esquecidos dentro da gaveta

Coloriram com sonhos e palavras os papeis em branco vazios

Que os anos derramaram sobre as gramíneas do jardim

Dentro da casa

Morava uma criança

Era uma criança como qualquer outra

Sonhadora

Um menino que sonhava o tamanho do universo

O tamanho do seu mundo

Sonhar era para ele o que a rosa era para o principezinho

Três vulcões

Quarenta e três pores do sol

A água que hoje cai na pia da cozinha

Em meio aos talheres sujos

Faz o menino relembrar que sonhos

Só são do tamanho do universo

Infinitos

Invencíveis

Quando sonhados

Se retirados da gaveta

E o tamanho do mundo do menino

Nunca foi sucinto

Pesa mais que a parede de um quarto mal-pintado

Sempre foi do tamanho dos sonhos de um menino

Volto para a minha escrivaninha empesteada de cupim

Aponto os lápis retirados da gaveta

Percebo que é sempre libertador

Sangrar o eu

Meu eu

Em cima de uma folha de papel em branco.