OUTONO INVERNO: ANUNCIAÇÃO
Sai de madrugada, destino certo
curto itinerário, tinha um propósito:
perceber o primeiro dia do inverno
ainda na boca semicerrada do outono
ainda na cauda da primavera distante.
Saiu para o dia escuro, no tempo escuro da rua.
Ali a mata contorna a vila,é uma ilha dentro da cidade.
Contrastam o marrom das casas sem reboco,
o verde vivo das árvores chamuscadas e os cinzas.
No fim daquela curva na rua ele viu a vida morrer no asfalto
era o brilho das lâmpadas erguidas no solitário alto dos postes.
Mais adiante, o desaterro dos morros artificiais
terra ajuntada, sobra das construções
dunas entre as casas e a mata entre o breu da noite
e a aurora anunciada.
Eis o destino deste homem, do fotógrafo o itinerário:
para os olhos o amanhecer, para os pés tripé fincado.
Ele é âncora e tombadilho, terra à vista na eterna conjugação.
Então ele registra o que não vê,
quem pode sentir o inverno desdobra-se
tapete ruidoso sobre as nuvens do amanhã?
É um barulho saído, é o movimento na agonia das estrelas que se apagam.
É o caos impondo ordem, explosão ensurdecedora.
É a boca da eternidade engolindo a manhã cobre
cobre a mata, cobre a vila, cobre os postes,
engole as lâmpadas, sua luz artificial e triste.
Não é por ser artificial que é triste,
é que tudo se repete como cenário.
A eternidade é mesmo reprise.
A única realidade exterior, face da verdade
é a música crescente no vetor horizontal.
Harmonia invisível na morte do anoitecido,
recuo sobrevida aura revelador do dia sido.
Nesse momento, o dourado aguava sobre jovens as nuvens da manhã,
não avança mais e recua frio tornando o céu azul marmóreo petrificado,
recua o dia penetrando as narinas dele, arruinando cartilagens românticas porque é a realidade da inclinação dos astros,
da Terra coberta por água, ele é um nada diante da anunciação
a máquina do mundo em suas engrenagens.
sob as lâmpadas apagadas dia se apaga
a beira do caminho, nas calcadas ainda não nascidas cobertas de grama, de mato, de humo silêncio.
Ele a postos é barco sobre o monte.
A variedade no horizonte são camadas e camadas de luz à vista.
A fotografia anuncia por fim, o raiar do dia no oco do oco do futuro
na melodia das esferas, o mistério de ser o tempo uma coisa só
que reveste o convulsivo das aparências de tudo que se move
de tudo que se vê.
Baltazar