Vestuário

A palavra corpo acordou

desejosa de nova roupagem.

Abriu, então, um guarda-roupas

de costuras e conjecturas.

Saia seria uma saída imperativa.

Vestido, uma variação pretérita.

Top, uma exaltação

anacronicamente veranil.

Transparências apagariam os mistérios.

Meias não serviriam. Queria inteirezas.

Rendas seriam uma ameaça

ou renderiam rasgos.

Muito delicadas para o dia.

Segunda-pele não,

para não incorrer em desperdício.

Seria um exagero de confissões.

E um pecado desfazer da primeira.

Calça imporia um calço.

Nenhum encosto bem viria.

Queria algo diverso dos modelitos usuais.

Elegante, mas sem gala.

Distinto, mas discreto.

Imponente, mas sem alarde.

Algo que não apenas adjetivasse,

mas que tivesse substância

e pesasse sobre o corpo,

além de ser um modo

de alongar o olhar.

Não queria conjugações.

Queria acima.

Por baixo,

o corpo nu da palavra.

Queria um sobretudo.