ACORDO, AGORA ACORDA
Todos os dias acordo para eu mesmo
para o mesmo
para o poema
antes de abrir os olhos reescrevo
corrijo, arranjo a eternidade ora
estancada no mesmo instante
Abro os olhos, ainda sonho?
Todos os dias
antes de abrir os olhos
suspeito acordado e antes de perceber
estou eu para o mesmo, para o poema.
Sem controle, vontade ou razão o processo
da rotina se atualiza, se repete sem fim.
Começa o novo dia pelo fim desmaiado
das sobras, toda manhã
antes de abrir os olhos para eu mesmo
para o mesmo, para o poema.
Pensamento é projeto, nunca resultado.
Porque acordo, amanhece?
Porque abro os olhos, penso?
O pensamento é impulso, extremidade,
tensão, o pensamento é potência recolhida.
O pensamento são as pontas do
arco e o arco inteiro, envergadas.
Nesse estado sonâmbulo suspeito
que talvez seja um acordo de preservação
porque pesam em minhas pálpebras vultos pintados
numa caverna na Serra da Capivara.
A luz rasga docemente o véu que separa
o negrume e permite encarnada, inumerável.
E eu me levanto, ergo o corpo para o eu mesmo
para o mesmo, para o poema, para o dia que te espera.
Antônio B.